Por Bruna Pinheiro / Formad
O medo de não conseguir emplacar o Cota Zero fez o Governo de Mato Grosso dar mais uma cartada. Menos de 24 horas antes da audiência de conciliação marcada no Supremo Tribunal Federal (STF), o ministro André Mendonça adiou por mais 21 dias a tratativa que pode derrubar ou pelo menos suspender a Lei inconstitucional. Organizações socioambientais avaliam a manobra como mais uma prova da inconsistência científica e da inconstitucionalidade da proposta de Mauro Mendes, que já foi rejeitada por órgãos federais que participariam da audiência.
O pedido de adiamento foi protocolado pela Procuradoria Geral do Estado no início da noite da última sexta-feira (1º). A resposta não demorou muito e ontem (04) o ministro André Mendonça publicou o despacho com o adiamento para o dia 26 de março. A justificativa para a remarcação é dar prazo aos agentes envolvidos na conciliação para que avaliem a Lei 12.434/2024, aprovada na última semana e que estabelece a lista de 12 espécies de peixes proibidas de transporte, armazenamento e comercialização. Conforme já alertado pelo Fórum Popular Socioambiental de Mato Grosso (Formad), a contraproposta em nada modifica a inconstitucionalidade do Cota Zero. (veja matéria).
Vale ressaltar que o ministro André Mendonça até hoje não emitiu decisão sobre as três ações diretas de inconstitucionalidade em tramitação no Supremo, assim como também não decidiu sobre os pedidos de ingresso como Amicus Curiae de organizações socioambientais, contrárias ao Cota Zero. Aguardam um retorno, além do Formad, o Fórum Nacional de Sociedade Civil na Gestão de Bacias Hidrográficas (FONASC-CBH), Instituto Centro de Vida (ICV), Instituto de Pesquisa e Educação Ambiental (Instituto GAIA), Associação do Segmento da Pesca do Estado de Mato Grosso (ASP-MT) e Defensoria Pública da União (DPU).
Para a advogada do Fórum Popular Socioambiental de Mato Grosso (Formad), Bruna Bolzani, apesar do prolongamento da expectativa de pescadoras e pescadores em relação à Lei, o adiamento da audiência tem potencial para deixar ainda mais evidente as falhas e inconstitucionalidades na alteração feita pelo Governo.
“O acordo feito na primeira audiência de conciliação era de que deveria haver um diálogo entre o Governo de Mato Grosso e os ministérios da Pesca e do Meio Ambiente, Ibama, AGU e INSS, o que não aconteceu. O Governo apresentou uma medida unilateral, ignorando a fase conciliatória proposta pelo ministro André Mendonça. Além disso, a lista de 12 espécies proibidas representa 90% da produção de pescado e é arbitrária, pois não tem nenhuma evidência ou estudo científico como embasamento e certamente será rejeitada pelas demais instituições convocadas pelo STF”, destacou a advogada.
A também advogada e consultora jurídica do Observatório Socioambiental de Mato Grosso (Observa-MT), Edilene Amaral, acrescenta que a pressão da mobilização das organizações da sociedade civil que acompanham o caso desde o início, somada a posicionamentos contrários a Lei aprovada, podem ter contribuído para essa estratégia do Governo. “Se o Estado tivesse segurança jurídica e embasamento científico a respeito da proposta, faria de tudo para que ela fosse rapidamente analisada e aceita. Seguimos acreditando na derrubada da Lei, até porque todos os órgãos envolvidos já analisaram a proposta, posto que o Governador já as apresentou em forma de Decretos, então as análises e rejeições já se encontram nos autos”.
De novo, uma Lei aprovada sem transparência
Como já de costume, a bancada governista na Assembleia Legislativa de Mato Grosso (ALMT) atuou em prol de Mauro Mendes, deixando passar mais uma Lei inconstitucional, com a aprovação da Lei 12.434/2024, que define aquelas 12 espécies de peixes proibidas de transporte, armazenamento e comercialização. Na primeira sessão para discutir o projeto, um pedido de vista adiou a votação. Já na segunda sessão, o presidente da Casa, Eduardo Botelho, anunciou o resultado de 11 votos favoráveis e sete contrários, sem a divulgação dos nomes dos deputados. Quem acompanhou a sessão, não viu a presença desses parlamentares no plenário e também não há como verificar o sistema virtual de votações da ALMT.
A falta de transparência em votações de interesse do Governo de Mato Grosso, a exemplo das duas recentes sobre a proibição da pesca, é algo cada vez mais frequente na Assembleia. Os poucos deputados que tentam incluir algum debate a respeito dos projetos são imediatamente ignorados, assim como não se vê a participação de parlamentares governistas em audiências públicas.
Foto: JLSiqueira