O Projeto de Lei Complementar (PLC n º 17/2020) de autoria do governador de Mato Grosso, Mauro Mendes, que tramita desde abril deste ano, já traz impactos negativos para os povos indígenas de Mato Grosso que vêm convivendo com ameaças de invasões de terras em meio à pandemia do novo coronavírus (Covid-19). Esse é o caso de dois territórios que, somados, têm pelo menos 107 imóveis sobrepostos. Nesses territórios os confrontos entre populações indígenas e fazendeiros já foram notificados. Ressalte-se o fato de que o projeto em questão sequer trata do SIMCAR, conforme apresentado no Art. 22, § 1º e 2º, em substitutivo integral, e, portanto, não diminui as ameaças.
Conforme mensagem encaminhada dia 13 de maio pelo Ministério Público Federal, esse Projeto de Lei fere a ordem constitucional brasileira e deve aumentar não apenas a insegurança jurídica dos Territórios Indígenas de Mato Grosso como também dos imóveis rurais do nosso estado. Nesse sentido, a decisão judicial suspendendo a Instrução Normativa nº 9 da FUNAI já confere precedente jurisprudencial que demonstra a severa insegurança jurídica a que ficarão expostos aqueles que pleitearem regularização fundiária com base neste PLC, intimamente inspirado na IN09.
Além de representar ameaça direta aos Povos Indígenas, o texto coloca um selo de invasores de terras na produção de commodities de Mato Grosso em um momento onde ameaças de boicotes à produção brasileira estão se multiplicando. Finalmente as medidas propostas estão em desacordo com os compromissos assumidos pelo Estado em diversos fóruns internacionais como a estratégia Produzir, Conservar e Incluir (PCI) lançada na COP21 em 2015, o Programa REM/MT firmado em 2017 ou as próprias condicionantes ambientais do empréstimo concedido pelo Banco Mundial em 2019.
Quando questionado sobre a pertinência deste Projeto de Lei e sobre a urgência de tê-lo debatido num tempo de isolamento social, o governo estadual respondeu que essas medidas devem ajudá-lo a melhor fiscalizar o desmatamento nas Terras Indígenas. Essa afirmação não é real porque o desmatamento em Terras Indígenas responde hoje por 1,1% do desmatamento total em Mato Grosso, além disso, a fiscalização em terras indígenas é de competência federal.
O momento de pandemia pelo qual o Brasil está passando não permite realizar um processo de consulta livre e previamente informada com os 43 povos indígenas de Mato Grosso, conforme demandado pela Convenção 169 da OIT. A exemplo disso podemos citar a forma como se construiu o componente indígena no Programa REM que trará enormes benefícios para o estado e para os indígenas, caso os índices de desmatamentos não evoluam. Acompanhamos de perto a construção dessa proposta que poderá garantir, por exemplo, a absorção da produção florestal aos indígenas com preço justo. Em resumo, o PLC 17/2020 destoa do que se entende por Desenvolvimento Sustentável já que não é economicamente eficiente, socialmente justo e ecologicamente equilibrado.
*Secretaria Executiva do Fórum Mato-grossense de Meio Ambiente e Desenvolvimento – Formad