Em 1992, impulsionados, sobretudo, pelas discussões que eclodiam no Brasil a partir da ECO-92, grupos organizados e movimentos sociais do Mato Grosso juntaram-se em uma articulação permanente. O objetivo era pôr em debate o modelo de desenvolvimento dominante e criar vozes dissonantes que reverberassem pelo encontro das Nações Unidas. O Fórum Matogrossense de Meio Ambiente e Desenvolvimento (Formad) dava os seus primeiros passos. Aos poucos, mais de 20 organizações representantes da sociedade civil somaram suas lutas e contribuições ao grupo.
Duas décadas depois, o Brasil é sede novamente da Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente e Desenvolvimento – agora chamada de Rio +20. E, da mesma maneira, portanto, é necessário não apenas resgatar a trajetória histórico-política do Formad, mas também pensar sobre os desafios de sua luta e construir propostas que interfiram nas decisões tomadas no Rio de Janeiro pelos chefes de estado e pela ONU, garantindo os direitos dos povos e grupos atingidos pelos impactos dessa forma de desenvolvimento.
Troca e sistematização de experiências
Foi para isso que se propôs a “Assembleia Formad 20 anos”. Entre 2 e 4 de abril, mais de 20 organizações matogrossenses socializaram problemáticas e ações de luta regionais. Para além de uma comemoração dos 20 anos de Fórum, a principal intenção do encontro era articular as diferentes entidades e movimentos do Mato Grosso para a composição de um banco de experiências com todas as informações obtidas sobre situações de injustiça ambiental. No segundo dia de encontro, foi desenvolvida uma oficina de mapeamento e coleta de dados sobre os impactos sócio-ambientais na produção de agrocombustíveis. Divididos em grupos, os participantes propuseram metodologias e construíram indicadores acerca desses impactos, sempre pensando de maneira crítica em relação aos próprios indicadores.
Para Caio Bruno Oliveira, jornalista do Formad, essa sistematização – oriunda do compartilhamento de experiências – desencadeia outras formas de resistência e produção de conhecimento, como, por exemplo, na Campanha Nacional contra os Agrotóxicos e pela Vida. “O encontro possibilitou uma articulação maior em rede”, afirmou, para em seguida complementar, “Acho que a grande importância da Assembleia foi mostrar que o Formad é um ator muito importante no estado de Mato Grosso. E que ainda haverá muitos anos pela frente”.
Por um outro modelo de desenvolvimento
No último dia de Assembleia, ocorreu a segunda etapa do Ciclo de Debates – Cúpula dos Povos e a Rio+20: Desafios e Perspectivas, com a temática “Agrotóxico mata”. Franciléia Paula de Castro, da FASE-MT, e Lucinéia Freitas, do MST, debateram o tema “A economia que queremos para o Mato Grosso”, sempre levantando questionamentos sobre “economia verde”, proposta que será defendida pela Rio +20.
“Contrapomos, por exemplo, o discurso e o modelo de economia dominante com o cenário da agricultura familiar em Mato Grosso”, explicou Franciléia. Para a agrônoma, boas propostas foram construídas, dessa reflexão crítica coletiva . “Houve também uma ‘provocação’ no que diz respeito ao cenário de políticas públicas. Que cenário é esse? De que maneira podemos interferir nas mudanças que acontecem na legislação?”, questionou, referindo-se ao quadro de transformações na legislação ambiental e de soberania alimentar em curso no Brasil.
Dividido em diferentes encontros, o Ciclo de Debates se propõe como um momento de construção conjunta da “Carta de Mato Grosso: Que Economia Queremos?” – documento que “é fruto de um processo de lutas muito antigo”, como esclareceu Caio Bruno. Em cada Ciclo de Debates são abordadas diferentes questões, por organizações diversas, as quais apresentam modos de trabalho distintos. “Isso possibilita criar muitas relações em torno de uma mesma temática, através de recortes pequenos e diferenciados”, explicou Caio.
O objetivo é pôr a Carta em circulação até junho, de maneira que ela interfira nos debates da Cúpula dos Povos – e, igualmente, na Conferência das Nações Unidas, a Rio+20. Produzido de maneira coletiva, o documento defende outro modelo de desenvolvimento, que tenha como centro a defesa da soberania alimentar e dos direitos por Justiça Ambiental e Social, dando valor, por exemplo, à agroecologia e à agricultura familiar
FONTE: Gustavo Cunha – FASE