Área xavante coloca em xeque licenciamento de hidrelétrica no rio Culuene

05/09/2006

Local: São Paulo – SP
Fonte: ISA- Instituto Socioambiental
Link: http://www.socioambiental.org/website/index.cfm

Construção de barragem em um dos principais formadores do rio Xingu, no Mato Grosso, está sendo feita em território dos índios Xavante, de acordo com estudos da Fundação Nacional do Índio.  Agora, o licenciamento ambiental da obra deverá ser conduzido pelo Ibama, caso o Congresso Nacional a autorize.

A identificação de uma Terra Indígena Xavante no local onde está sendo construída a Pequena Central Hidrelétrica (PCH) Paranatinga II, no rio Culuene, um dos principais formadores do rio Xingu, no Estado do Mato Grosso, é o mais novo ingrediente do imbróglio que envolve a polêmica obra.

A PCH Paranatinga II está sendo erguida no leito do rio Culuene entre os municípios mato-grossenses de Campinópolis e Paranatinga.  O projeto, iniciado em 2004, prevê o alagamento de uma área de 1.290 hectares, dos quais 920 de vegetação nativa.  O lago será formado pela edificação de duas barragens e o projeto está orçado em R$ 46,4 milhões para a geração de 29 megawatts de energia.

A hidrelétrica vem sendo objeto de protestos por parte das comunidades indígenas alto-xinguanas, alarmadas com seus efeitos na reprodução dos peixes que constituem a base de sua dieta alimentar.  Estudo recente sobre as conseqüências da PCH confirma este impacto negativo.  Os índios também afirmam que o trecho do Culuene que está sendo desfigurado pelas dinamites e máquinas é um dos locais sagrados na mitologia indígena do Alto Xingu.  Saiba mais.

O empreendimento, que foi licenciado pelo governo do Mato Grosso em 2004 e já tem boa parte das obras executada – apesar de decisão judicial haver determinando sua paralisação -, deve agora passar por um novo processo de licenciamento ambiental, conduzido desta vez pelo Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (Ibama).  A razão disto é exatamente a identificação, por parte da Funai, de território xavante no local da obra.

Novo processo de licenciamento ambiental
A federalização do licenciamento da Paranatinga II foi pedida pela primeira vez em Ação Civil Pública movida pelo Ministério Público Federal (MPF) no Mato Grosso, no começo de 2005.  O pedido foi aceito pela Justiça Federal, que ordenou, em abril deste ano, a interrupção das obras até uma melhor avaliação dos impactos da usina sobre as comunidades indígenas do Parque do Xingu e nas terras xavante localizadas na região.  “Mas a obra não parou, ao contrário, foi acelerada, segundo o MPF”, afirma o Juiz federal Julier Sebastião da Silva que, diante da denúncia de procuradores, emitiu liminar determinando a busca e apreensão do maquinário da empresa, além estabelecer multa pelo descumprimento da decisão judicial.

Até o começo de junho, entretanto, o Ibama resistia à idéia de assumir o licenciamento da PCH.  Mudou de posição apenas após ser informado pela Fundação Nacional do Índio (Funai) de que o local da barragem de fato incide sobre área estudada há seis anos para demarcação de novo território xavante.  Agora, apesar de confirmar que o licenciamento da PCH será feito pelo órgão, o Ibama não sabe dizer quando e se o processo será retomado.  “Com a informação de que há uma terra indígena no local da barragem, o empreendimento terá que ser autorizado pelo Congresso Nacional antes do Ibama iniciar qualquer estudo”, diz Luiz Felipe Kunz, diretor de licenciamento ambiental do órgão federal.

De acordo com a Constituição Federal, todo empreendimento de geração de energia que afete diretamente áreas indígenas deve ser autorizado pelo Congresso Nacional antes de ser iniciado.  A Paranatinga Energia, holding dona do empreendimento, afirma por meio de sua assessoria de imprensa que espera ser notificada oficialmente pelo Ibama antes de tomar qualquer providência sobre os rumos de seu empreendimento.

Fazendeiros impedem levantamento fundiário
A Terra Indígena Xavante, denominada TI Hu’Uhi, começou a ser estudada por um Grupo de Trabalho (GT) da Funai no ano 2000.  Em princípio, tratava-se de uma ampliação da TI Parabubure, cujo limite oeste é exatamente o rio Culuene.  Ao concluir o laudo antropológico da TI, entretanto, o GT recomendou que a Hu’Uhi passasse a ser considerada uma nova terra indígena.  O processo de identificação dos limites da TI está empacado.  A Funai afirma que seus funcionários têm enfrentado resistência dos fazendeiros locais para realizar o levantamento fundiário da região, etapa fundamental no processo de regularização das terras indígenas no Brasil.

A nova TI Xavante não consta nos estudos encomendados pela Paranatinga Energia a respeito dos impactos socioambientais do empreendimento.  A responsável pelos estudos, a arqueóloga Érika González, da Universidade de São Paulo, foi informada pelo ISA sobre a questão e demonstrou perplexidade.  “Não sabíamos desta TI.  Seguimos o Termo de Referência feito pela Funai para executarmos nosso trabalho.  Agora vamos nos buscar nos inteirar da situação”.

A Funai, por sua vez, afirma que a Paranatinga Energia S/A sabia da existência dos estudos sobre o território xavante no local planejado para a PCH.  A prova disso seria um memorando do órgão federal, presente no processo de licenciamento da barragem, o qual pedia a plotagem das coordenadas da obra para identificar as terras indígenas existentes e as em fase de identificação na região.  O mapa encaminhado pela Funai incluía a Hu’Uhi, sem os limites da área.  A falta de limites geográficos, segundo a Funai, foi a razão para que a nova TI ficasse de fora do Termo de Referência para os estudos de impacto.  “A Funai optou por esperar uma proposta de delimitação.  A proposta saiu depois de entregue o TR e foi apresentada agora para o Ibama”, esclarece a assessoria de imprensa do órgão.

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