ISA – Dona Teresinha Maria Goldoni nasceu no Rio Grande do Sul e chegou ao Garapu, um bairro rural da cidade de Canarana, há 23 anos. Com seus dois filhos planta soja além de possuir algumas cabeças de gado. Quando ela e o marido compraram a propriedade – Fazenda Simone, uma antiga fazenda de pecuária – tudo já estava desmatado. Porém, já naquela época tinham um acordo com vizinhos para reflorestar o entorno da represa, do córrego do Marimbondo, construída para levar energia à vila do Garapu.
Para cumprir o antigo compromisso e com o apoio da campanha Y Ikatu Xingu, em 2006, Teresinha cercou uma área de três hectares e deu início à recuperação da mata ciliar ao redor da represa. Como possui uma máquina plantadeira de soja, ela deu início a um experimento de reflorestamento mecanizado com base nos Sistemas Agroflorestais (SAFs). E mais duas técnicas de plantio estão sendo experimentadas na beira da represa: o plantio manual de mudas e o plantio de sementes a lanço. Os SAFs buscam unir o plantio de espécies de crescimento rápido – feijão-guandú, feijão-de-porco, milho, abóbora – com o de espécies de crescimento lento – pequi, baru, jatobá, caju. As espécies de crescimento rápido sombreiam aquelas de crescimento mais lento, além de servirem de adubo verde, enriquecendo o solo com matéria orgânica e nutrientes.
Os métodos e os resultados desse trabalho poderão ser conferidos durante a I Feira de Iniciativas Socioambientais, que acontecerá em Canarana, no Mato Grosso, de 16 a 18 de outubro. O objetivo da feira será mostrar iniciativas empreendidas na região para a conservação dos recursos naturais da Bacia do Xingu – em especial para a recuperação das matas ciliares – por proprietários de terras, movimentos sociais, comunidades indígenas e agricultores familiares.
O experimento na Fazenda Simone foi feito da seguinte forma: na beira da represa o plantio foi realizado de forma convencional com mudas de espécies exóticas e nativas do Cerrado; numa segunda área uma plantadeira de soja distribuiu pelo solo 200 quilos de sementes de mais de 100 espécies de árvores nativas junto com soja, milho, milheto, sorgo, gergelim, urucum, aroeira e feijão-guandú; numa terceira área, o plantio de 200 quilos de sementes de mais de 100 espécies nativas do Cerrado com algumas culturas temporárias foi feito a lanço, ou seja, manualmente. Tanto no experimento com plantadeira quanto aquele feito manualmente, buscou-se obter a mesma densidade de 20 a 30 árvores por m².
Resultados – “Um ponto forte e inovador do evento é que o público poderá ver os resultados socioambientais na prática por parte de quem está construindo histórias diferentes na Bacia do Xingu”, afirma Rodrigo Junqueira, coordenador adjunto do Programa Xingu, do Instituto Socioambiental (ISA), um dos parceiros da Campanha Y Ikatu Xingu.
Segundo relatórios técnicos elaborados pelo ISA, depois de dois anos, e com base nos custos do plantio versus o rendimento da produção da agrofloresta, o plantio de sementes com plantadeira de soja foi o que apresentou melhores resultados. Constatou-se que, com o mesmo custo de produção de uma muda, é possível plantar mais de 100 sementes direto no campo. Ao invés de ter como resultado do plantio convencional uma muda a cada 6 m², na semeadura direta tem-se de 2 a 10 árvores por m², imitando o que ocorre na natureza quando a mata se recupera. Com a semeadura direta, as raízes das árvores também se desenvolvem melhor, o que faz com que elas tenham maior resistência à época da seca.
“É uma coisa boa fazer o reflorestamento na beira dos córregos e das represas. As árvores demoram a crescer e não vemos os resultados de um dia para o outro. Mesmo assim vale a pena, porque em apenas 18 meses a beira da represa já está mais bonita”, comemora Dona Teresinha.
Fazenda Bang Bang – A Fazenda Bang Bang, de Luiz Carlos Castelo, é outro exemplo da economia que o produtor pode conseguir com o reflorestamento feito com plantio direto. Em 2006, a fazenda começou a participar do projeto Recuperação de Nascentes e Matas Ciliares do Xingu – Um Exemplo de Concertação Intersetorial, promovido pela campanha Y Ikatu Xingu em São José do Xingu, com financiamento do Fundo Nacional do Meio Ambiente, e passou a receber assistência técnica do ISA. Esse projeto também estará exposto em um estande na I Feira de Iniciativas Socioambientais.
A Bang iniciou naquele ano o plantio de sementes de 46 espécies nativas em Sistema Agroflorestal (SAF), associando espécies nativas ao feijão-guandú e ao feijão-de-porco. Já foram plantadas mais de 70 mil mudas de espécies nativas e 1,5 tonelada de sementes em quase 104 hectares à beira de nascentes e cursos d’água na propriedade. Essa área tornou-se um campo experimental de reflorestamento em larga escala e diversas técnicas foram ali testadas, incluindo o plantio direto a lanço, com lançadeira mecânica (Vincon) de sementes.
O experimento na fazenda comprovou as vantagens econômicas do plantio direto de sementes, que se mostrou mais barato do que as mudas. Enquanto o primeiro custou R$ 1.245,39 por hectare, o segundo saiu por R$ 2.358,19 por hectare (incluindo gastos com mão-de-obra, combustível, horas-máquina, adubo, compra de sementes e mudas).
II Encontro Nascentes do Xingu – Paralelamente à I Feira de Iniciativas Socioambientais, acontecerá o II Encontro Nascentes do Xingu para debater os rumos e os desafios que a Campanha Y Ikatu Xingu terá pela frente. Mesas redondas, palestras, mini-cursos e oficinas irão proporcionar a discussão sobre temas relevantes para a população que vive na Bacia do Xingu. Esses eventos serão realizados pelo ISA e a Prefeitura de Canarana, em parceria com o Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Lucas do Rio Verde, Instituto Centro de Vida (ICV), Fórum Matogrossense de Meio Ambiente e Desenvolvimento (Formad) e Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam), com apoio da Fundação Rainforest da Noruega, União Européia, Usaid/The Nature Conservancy e Fundação Doen.
O I Encontro Nascentes do Xingu aconteceu em outubro de 2004, também em Canarana, e reuniu pecuaristas, indígenas, agricultores familiares, organizações não-governamentais, governamentais e de pesquisa e poder público para debaterem soluções para reverter o quadro de degradação das nascentes do Rio Xingu. E foi naquele momento que nasceu a Campanha Y Ikatu Xingu (que significa “água boa, água limpa do Xingu”, na língua dos Kamaiurá, um dos povos que habita o Parque Indígena do Xingu) para proteger e recuperar as nascentes e as matas de beira de rio do Xingu.