Campanha Y Ikatu Xingu – Os técnicos do ISA Osvaldo Sousa, Luciano Eichholz e Eduardo Malta visitaram em 24 e 25 de janeiro, lotes de 18 parceleiros no Projeto de Assentamento (PA) Brasil Novo, em Querência, MT. A idéia era avaliar como andavam as práticas agroecológicas de restauração de Áreas de Preservação Permanente (APPs), já que a maioria desses agricultores participou de um curso de Sistemas Agroflorestais promovido dois anos atrás pela Campanha Y Ikatu Xingu, e havia se comprometido a adotá-las em suas terras. Criada há quatro anos, a campanha tem o objetivo de reunir diversos parceiros e atores locais para proteger e reflorestar as beiras de rio e nascentes que fazem parte do lado mato-grossense da Bacia do Rio Xingu.
O curso foi ministrado pelo pesquisador Ernst Götsch, reconhecido especialista em Sistemas Agroflorestais (SAFs), no PA Brasil Novo no qual mostrou aos parceleiros técnicas agroecológicas que pudessem enriquecer suas roças e promover a recuperação das APPs – áreas próximas a rios, córregos e represas no interior de seus lotes. Outros assentamentos da região também participaram do curso.
Durante a visita, os agricultores trocaram experiências e vivências e aprenderam com o relato dos erros e acertos dos vizinhos. Também puderam sugerir melhorias e reforçar algumas práticas de auxílio, por exemplo, no controle da braquiária e no enriquecimento do solo. O intercâmbio entre eles reiterou seu compromisso com a campanha.
O primeiro lote visitado foi o de Abraão Vieira dos Santos, que mora no Brasil Novo com a esposa e quatro filhos desde 2000. Em uma área que foi cercada para o gado não invadir, Abraão plantou grande diversidade de árvores em meio às culturas de mandioca e milho. “Não sei dizer quantos tipos de árvore têm aqui, mas lembro de ter plantado sementes de buriti, taperebá, cajá, jaca, goiaba, mogno, jenipapo, cagaita e pequi”. O agricultor contou que a terra foi gradeada (revolvida por um trator munido de grade) e a seguir foram plantadas as sementes doadas pela Campanha Y Ikatu Xingu. Embora algumas sementes tenham germinado, o crescimento das árvores está comprometido pelo solo que necessita de nutrientes e pela proliferação de capim.
Os técnicos do ISA e outros parceleiros sugeriram a Abraão plantar feijão-guandu e feijão-de-porco em meio às árvores, porque as leguminosas sombreiam o solo e impedem o crescimento da braquiária. Além disso, fixam nitrogênio no solo, servindo como adubação verde. “Tenho certeza que daqui a quatro anos essa área estará dando frutos”, acredita Abrãao, que se diz confiante nas novas técnicas aprendidas.
Feijão-de-proco e feijão-guandu
Já no lote da família de Vicente Bogo, que mora há cinco anos no Brasil Novo, o plantio foi iniciado em setembro do ano passado em área de dois hectares. Ali, é possível ver os resultados das práticas agroecológicas. Crescem pés de baru, caju, pequi e mamão. Com as sementes dessas árvores, Bogo plantou o feijão-de-porco e feijão-guandu que impediram o crescimento do capim, enriqueceram o solo e estão favorecendo o crescimento das árvores.
Também no lote de Domingos Ferreira de Sousa, o Dominguinhos, os parceleiros observaram um exemplo de produção para a subsistência aliada à conservação ambiental. Antes mesmo de conhecer a Campanha Y Ikatu Xingu, Dominguinhos plantava diversas espécies de árvores em uma mesma área e deixava intocada a área da beira do rio que passa em seu lote. Hoje, as árvores já produzem muitos frutos, entre mangabas e pequis, e o curso ministrado por Götsch significou um incentivo para o agricultor, que passou a plantar ainda mais árvores e parou de roçar o mato que crescia ao redor delas. Dominguinhos começou a perceber que algumas árvores morriam quando ele limpava o terreno.
Outra experiência considerada modelo no Brasil Novo está no lote de Armando Menin, que possui APPs em processo de regeneração por meio do plantio feito com “muvuca” de sementes, além de sistemas agroflorestais. Menin vem utilizando largamente a adubação verde, por meio do plantio de feijão-de-porco e feijão-guandu, comprovando na prática que essas leguminosas favorecem as culturas agrícolas. Para verificar a eficácia dessas espécies, Menin cultivou milho em duas áreas: com e sem feijão-de-porco. Na área onde o feijão foi semeado, o milho cresceu mais e ficou vistoso, ao contrário da parte do milharal que não recebeu a semente.
Mudas X Sementes
Durante as visitas foi possível avaliar alguns plantios realizados com mudas. No lote de Jailson Gomes de Jesus, as 100 mudas de pequi plantadas por ele sumiram no meio da braquiária e muitas morreram. Ele também plantou leguminosas, mas em quantidade muito pequena, insuficiente para conter o capim. “Acho que plantar muda aqui não adianta mais, vou experimentar a ‘muvuca’ de sementes”, lamenta o agricultor. Além de fazer o plantio de sementes, ele foi aconselhado pelos demais parceleiros a plantar gergelim, batata-doce e espécies leguminosas para conter o avanço do capim e das formigas. Para o biólogo Eduardo Malta, o plantio com mudas é uma técnica tradicional de reflorestamento, mas que apresenta custos muito altos e resultados pouco animadores. “Isso é o que todo mundo faz: plantar muda e ficar limpando o terreno para tirar o capim. Mas é preciso disseminar outras formas de plantio, com custos menores e que dêem certo”, avalia.
A Campanha Y Ikatu Xingu incentiva a mistura de diferentes sementes de árvores formando uma “muvuca”, que depois é plantada diretamente no solo em pequenas covas. Junto com as sementes florestais são plantadas espécies leguminosas que têm a função de proteger o solo, enriquecendo-o e controlando o capim. Esse sistema de plantio inédito está sendo disseminado por técnicos da Campanha Y Ikatu Xingu, e tem se mostrado mais barato que o realizado com mudas, que precisam ser produzidas e depois transportadas. Além da vantagem econômica, percebe-se que as árvores que nascem das sementes plantadas no solo são mais resistentes do que as mudas.
No domingo, dia 25, depois da conclusão das visitas, o ISA distribuiu aos parceleiros 140 quilos de sementes de 46 espécies diferentes, além de 260 quilos de feijão-guandu e feijão-de-porco, suficientes para cada participante plantar 0,4 hectare. Os parceleiros ficaram responsáveis por fazer as misturas de sementes e dar continuidade ao trabalho de reflorestamento da Campanha Y Ikatu Xingu.