Nota de repúdio contra Decreto que revoga proteção de áreas úmidas do Guaporé e Araguaia

É inaceitável que o governo estadual de Mato Grosso se preste a tamanhos retrocessos ambientais em nome de interesses eleitoreiros.

O Fórum Mato-grossense de Meio Ambiente e Desenvolvimento (Formad) vem a público mais uma vez externar sua indignação em face do lamentável retrocesso socioambiental promovido pelo atual governo estadual, que demonstra claramente seu completo descompromisso com a qualidade de vida e sustentabilidade.

O governo do estado de Mato Grosso, nas pessoas do governador sr. Pedro Taques e do secretário de Meio Ambiente, sr. André Luís Torres Baby, com a promulgação do DECRETO ESTADUAL Nº 1.647, DE 29 DE AGOSTO DE 2018está colocando em risco a conservação de duas regiões importantíssimas para provimento de água e biodiversidade: as áreas úmidas ou pantanais do Araguaia e Guaporé.

Endossando a manifestação do Ministério Público do Estado de Mato Grosso, que publicou nota oficial no dia 30 de agosto de 2018, o referido decreto revogou parte do § 2º do artigo 35 do Decreto 1031/2017, que classificava a Planície Inundável/Pantanal do Guaporé e Araguaia como área de uso restrito. Sem mais esta restrição, passa a ser aceitável, pelo governo de Mato Grosso, a exploração econômica das áreas úmidas do Araguaia e Guaporé, contrariamente a tratados internacionais assinados pelo Brasil, como a Convenção Ramsar.

Segundo o Comitê Nacional de Zonas Úmidas (CNZU/MMA), áreas úmidas continentais de água doce, como neste caso, são ecossistemas na interface entre ambientes terrestres e aquáticos, permanente ou periodicamente inundados ou com solos encharcados, com comunidades de plantas e animais adaptados à sua dinâmica hídrica. Essas áreas, quando devidamente conservadas, como determina também a Constituição Federal em seu artigo 225 , bem como o Código Florestal Brasileiro, garantem segurança hídrica e alimentar de cidades, comunidades ribeirinhas, povos e comunidades tradicionais. Asseguram água em quantidade e qualidade, bem como, por exemplo, a produção pesqueira que dá sustento, emprego e renda a milhares de famílias, além de ser a base do turismo nessas regiões.

O Código Florestal diz em seu Artigo 10 : “Nos pantanais e planícies pantaneiras, é permitida a exploração ecologicamente sustentável, devendo-se considerar as recomendações técnicas dos órgãos oficiais de pesquisa, ficando novas supressões de vegetação nativa para uso alternativo do solo condicionadas à autorização do órgão estadual do meio ambiente, com base nas recomendações mencionadas neste artigo.”

A comunidade científica ainda não emitiu essas recomendações técnicas e as áreas úmidas Pantanal, Araguaia e Guaporé são, conceitualmente, consideradas como pantanais. Não obstante o fato de não manifestação da comunidade científica neste ponto específico, estas são áreas de valor inestimável e se constituem em apoio à mitigação das mudanças climáticas. Não é sem motivo que o Relatório da ONU sobre Desenvolvimento dos Recursos Hídricos se intitula “Soluções baseadas na natureza para a gestão da água”.

Assim, o governo de Mato Grosso, ao determinar que “Não se aplicam às planícies alagáveis do Guaporé e do Araguaia as restrições impostas por lei específica ao Pantanal mato-grossense e planície pantaneira do Rio Paraguai”, neste decreto promove o retrocesso às salvaguardas que garantem a conservação das regiões do Araguaia e Guaporé e isso não é permitido juridicamente.

Causa espanto mais esta afronta ao meio ambiente em pleno processo eleitoral, quando interesses locais vêm pressionando cada vez mais pela flexibilização das políticas públicas socioambientais em troca de apoio e alianças políticas, desgraçadamente ameaçando o Araguaia e o Guaporé no alvo dessa manobra.

O Formad considera, ainda, que este decreto é uma afronta à ética do exercício profissional de agentes públicos, que deveriam atuar na implementação de práticas econômicas com base nas premissas do desenvolvimento sustentável, que deve considerar, também, além do desenvolvimento econômico, o desenvolvimento social com conservação ambiental.

É inaceitável que o governo estadual de Mato Grosso se preste a tamanhos retrocessos ambientais em nome de interesses eleitoreiros, tendo vigente uma iniciativa PCI (Produzir, Conservar e Incluir) anunciado na Conferência do Clima de Paris, em 2015, até hoje sem resultados concretos, e tendo garantido nacional e internacionalmente ousados compromissos com a redução do desmatamento que, aliás, justificaram o recebimento de mais de 170 milhões de reais como prêmio de doadores como os governos da Alemanha e do Reino Unido no Programa REM. É uma vergonha!

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