Estação Vida – Aprofundar o diálogo entre Brasil e Europa acerca da produção agrícola responsável. Esse pode ser um bom caminho para encontrar soluções sobre um tema que tem gerado não só divisas para o Brasil, mas também tensões entre ambos continentes. Uma mostra disso foi o debate foi organizado na França no último dia 19 pelo Instituto de Desenvolvimento Sustentável e Relações Internacionais (IDDRI na sigla em francês), com apoio do Instituto Centro de Vida e Cirad, no âmbito do Projeto Diálogos.
Com o título Produção agrícola, comércio e meio ambiente: o caso do Estado do Mato Grosso, a discussão confrontou os pontos de vista existentes na França e no Brasil sobre produção agrícola, comércio e meio ambiente em Mato Grosso, reunindo o governador Blairo Maggi, pesquisadores e representantes de organizações não-governamentais francesas.
Stéphane Guéneau, do IDDRI, iniciou o debate apontando a necessidade de se refletir sobre o papel das políticas públicas para conservação e dos mercados de produtos agropecuários sobre a regulação do desmatamento, bem como os critérios para se falar sobre soja sustentável e o papel da cooperação internacional nesse cenário. O viés do diálogo, focado no desmatamento, não é estranho. A atenção sobre o desmatamento nas florestas tropicaisganhou destaque este ano com a divulgação dos relatórios do IPCC sobre mudanças climáticas. Nele, o peso do desmatamento na parcela de emissões de gás carbônico do Brasil – que está entre os 10 maiores emissores do planeta – colocou o país em um lugar privilegiado: é o único que pode reduzir suas emissões em quase 30% sem mexer em sua estrutura energética, já que suas emissões não provêm majoritariamente da queima de combustíveis fósseis.
“Quais são as medidas que a comunidade internacional pode tomar para apoiar uma mudança significativa dos modelos de produção na Amazônia brasileira, em um contexto de crescimento da demanda de produtos agrícolas e do mercado de carne? São respostas a essa questão que esse debate começa a buscar”, aponta Richard Pasquis, do Cirad.
Em um cenário em que a demanda por soja na China e da Europa tende a crescer, o Brasil é identificado como um país que ainda tem condições de aumentar sua produção. No entanto, isso poderia implicar em aumento do desmatamento e do preço da terra, provocando mais desequilíbrios ambientais, sociais e econômicos. Produzir com responsabilidade socioambiental é o grande desafio que se impõe para o país, e muito especialmente para Mato Grosso, campeão no desmatamento da Amazônia Brasileira até 2005.
Em sua palestra, Maggi afirmou que o Estado tem um grande potencial agrícola e pretende valorizar essa produção em benefício do desenvolvimento econômico do Estado, mas com responsabilidade ambiental, frisou. O governador disse ser favorável à continuidade da moratória da soja e falou até mesmo em moratória para qualquer tipo de desmatamento na Amazônia. O discurso do governador de Mato Grosso não é uma bravata. Blairo Maggi, que já foi chamado de rei de duas coroas pelo Financial Times em 2005 – do desmatamento e da soja – percebeu a oportunidade de captação de recursos que o pagamento por serviços ambientais pode proporcionar ao Estado, tanto pelo reflorestamento quanto pelo desmatamento evitado.
É com essa bandeira, aliás, que Maggi já visitou os Estados Unidos em maio, além de Holanda, Alemanha, Bélgica e França neste mês. O governador tem defendido a tese de que os países desenvolvidos devem pagar pela conservação das florestas tropicais, dada sua importância para evitar o desastre climático que se desenha no horizonte e a fragilidade econômica dos países que as detêm.
Todos esses nuances do debate sobre agronegócio e responsabilidade socioambiental deverão estar presentes no evento que será organizado pelo Projeto Diálogos no segundo semestre de 2008. E a data é propícia: os dois anos de moratória sobre o plantio de novas áreas de soja na Amazônia Brasileira estará chegando ao fim e impõe a pergunta: o que vem depois?
O projeto Diálogos é uma parceria entre Centro de Desenvolvimento Sustentável da Universidade de Brasília (CDS/UnB), Centro de cooperação internacional em pesquisa agronômica para o desenvolvimento/França (Cirad), Instituto Centro de Vida (ICV), Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam) e WWF-Brasil, financiado pela União Européia. Seu objetivo é apoiar o diálogo entre diversos atores da sociedade, setores público e privado, tendo em vista a construção e implementação de políticas que visem a sustentabilidade social, econômica e ambiental na área de influencia da BR-163, na Amazônia Brasileira.