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Começa a corrida pelo REDD na Amazônia

Um encontro encerrado hoje na Chapada dos Guimarães, em Mato Grosso, discutiu os rumos de um programa estadual de REDD nesse estado.

REDE GTA – Um encontro encerrado hoje na Chapada dos Guimarães, em Mato Grosso, discutiu os rumos de um programa estadual de REDD nesse estado. “Foi uma discussão muito movimentada”, afirmou o coordenador do regional Nortão Matogrossense da Rede GTA, Nilfo Wandscheer, enquanto deixava o local para tomar providências contra um despejo judicial de assentamento em Nova Mutum existente desde 2002, mas não oficializado pelo Incra, órgão do Ministério de Desenvolvimento Agrário.

REDD é uma sigla climática que significa Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação, ainda não regulamentada na Convenção de Mudanças Climáticas das Nações Unidas em seu último encontro de Copenhage, mas já movimentando atenções e interesses financeiros na Amazônia Brasileira.

Em Rondônia, a regional da Rede GTA e a Kanindé Etnoambiental apóiam a associação local dos engenheiros florestais (AREF) que realiza em 26 e 27 de fevereiro o primeiro seminário amazônico sobre seqüestro florestal de carbono e mudanças climáticas visando o acordo global pós-Kyoto. Com apoio do regional da Rede GTA e da Kanindé Etnoambiental, vai reunir especialistas do Ministério de Meio Ambiente, Ministério de Ciência e Tecnologia, Organização Mundial de Agricultura (FAO) e Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). O site é www.seminarioco2.com.br

No Acre, o mês de fevereiro também é de consolidar as consultas sobre o Programa de Valorização do Ativo Ambiental em sua fração carbono, que corresponde ao REDD. “A gente renovou agora o conselho local e muitos companheiros estão dizendo que o valor oferecido pelo governo pela conservação do carbono ainda está baixo, mas sempre tem essa distância entre o querer e o poder”, comenta Manuel Cunha, presidente do Conselho Nacional dos Seringueiros (CNS). O programa estadual inclui o apoio para certificações como de orgânicos ou manejo florestal que elevam o valor dos produtos e também o uso da leguminosa mucuna para recuperar áreas degradadas. E lembra que o estoque de carbono é apenas um dos serviços ambientais da floresta ao lado da biodiversidade, do fornecimento de água pura e da limpeza do ar.

A base do programa acriano foi o seu zoneamento econômico-ecológico (ZEE), que agora está em consulta para toda a Amazônia no site do Ministério do Meio Ambiente – www.mma.gov.br -, onde também fala diversas vezes no REDD.

Em dezembro um dos representantes indígenas no evento de Copenhage, Lúcio Terena (da COIAB, a Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira), disse em entrevista para o site www.climaedesmatamento.org.br que “ainda não temos um modelo que deixe claro como vai ser, porque sem autonomia em uma terra indígena com projeto de REDD perdemos nosso modo de vida. O mercado também não é seguro, muda moeda, muda o custo do carbono. Com isso, se temos um contrato podemos perder”.

Desafios de implantação

Os movimentos sociais sabem que em 2004 surgiu uma das propostas pioneiras nesse assunto que foi o Proambiente (Programa de Desenvolvimento Sustentável da Produção Familiar na Amazônia), onde os serviços ambientais já eram colocados como um valor nas terras de comunidades da floresta e de pequenos agricultores. Surgido nos Gritos da Amazônia, organizados pela Fetagri (Federação de Trabalhadores na Agricultura do Pará) com apoio de outros movimentos, foi oficializado pelo governo federal e depois paralisado.

Na mesma entrevista de Lúcio Terena o presidente da Rede GTA, Rubens Gomes, afirmou que “os direitos reais de populações indígenas e tradicionais ainda não estão garantidos e precisam estar. São as populações que protegem a floresta, não os governos, mas nos acordos oficiais há escassez desses direitos e provoca fragilidade. Estive em 2008 na reunião sobre mudança climática realizada em Acra (Gana) e pude ver que as lideranças presentes (Ásia, África e Américas) eram na grande maioria de florestas públicas sem direito a território”.

Esse é um dos motivos para as reuniões de lideranças do GTA, do CNS e da COIAB em Manaus (AM) de 3 a 5 de março, em Porto Velho (RO) de 29 a 31 de março e em Belém (PA) de 14 a 16 de abril para definir critérios que orientem essa leva de projetos que está chegando à região. Os 8 princípios que orientam os critérios são o cumprimento da lei, a garantia de direitos, a distribuição de benefícios, a sustentabilidade econômica e redução de pobreza, a conservação ambiental, a participação dos atores desde a elaboração, a transparência e a coordenação. A consulta de que as reuniões fazem parte está em www.reddsocioambiental.org.br.

Demais estados

No Amazonas, a questão REDD acabou ficando concentrada na Fundação Amazonas Sustentável criada em 2007 pelo Governo do Estado com o Banco Bradesco. Atua em áreas públicas estaduais e criou mecanismos como a “bolsa floresta”, com pequena remuneração para as famílias das comunidades residentes. Embora com grande número de especialistas e personalidades em sua estrutura, personaliza sua imagem no diretor-geral Virgílio Viana. Mesmo que involuntariamente, isso reduz o campo de debate no estado.

No Tocantins ocorre um fenômeno semelhante, onde a questão fica mais visível no Instituto Ecológica, ONG criada em 2000 e uma das disseminadoras do método de carbono social, relacionado a padrões internacionais desenvolvidos pelo CCB (Clima, Comunidade e Biodiversidade). Entre seus projetos atuais está o gerenciamento de 3 mil hectares de floresta no Cerrado com financiamento da montadora Hyundai (www.hyundai.carbonfund.org).

No Pará, diversos projetos estão em andamento desde o primeiro semestre de 2009. Um deles, em São Félix do Xingu, é uma parceria do governo estadual com a ONG TNC (The Nature Conservancy). Em seu seminário de lançamento a diretora do Museu Goeldi, Ima Vieira, destacou a necessidade de resolver as questões de monitoramento de carbono (estimativas reais do que é estocado nas florestas e definição clara de degradação). E também dos mecanismos justos para pagamento por desmatamento evitado. “Se nós ficarmos atrelados somente ao mercado, traremos uma injustiça enorme aos setores que tem trajetórias mais corretas do ponto de vista ambiental como o extrativista, que é o que mantem a floresta efetivamente em pé”.

O próprio Museu Goeldi é um dos parceiros de outra proposta no Pará, ao lado das ONGs Imazon, Imaflora e Conservation International, do projeto REDD Calha Norte – uma imensa área contínua de 12,5 milhões de hectares ao norte do rio Amazonas entre as divisas com Amazonas e Amapá.

No Maranhão, apesar de discursos do governo sobre a questão dos recursos, não há projetos divulgados de REDD. Mas iniciativas locais como o Fundo Maranhão Solidário, unindo entidades para viabilizar pequenos empreendimentos de comunidades, ou as leis de babaçu livre, que preservam bosques de palmeiras, podem contribuir no debate além das próprias reservas marinhas dos pescadores artesanais.

No Amapá, o principal encaminhamento previsto pelo governo no final do ano passado era o fortalecimento estatal com a criação do Instituto Estadual de Florestas (IEF-AP) e do Instituto de Meio Ambiente e Ordenamento Territorial (IMAP), embora com aspectos de participação e conselhos. .

Em Roraima, a questão também parece estar pouco debatida. Alguns governadores parecem estar mais voltados para o aumento de fatia de recursos federais.

Críticas e alertas

Em outubro de 2009, dezenas de movimentos sociais e ambientais divulgaram a Carta de Belém, criticando os mecanismos de mercado para as mudanças climáticas. “As propostas de REDD em debate não diferenciam florestas nativas de monoculturas extensivas de árvores, e permitem aos atores econômicos – que historicamente destruíram os ecossistemas e expulsaram as populações que vivem neles – encontrarem nos mecanismos de valorização da floresta em pé maneiras de continuar e fortalecer seu poder econômico e político”.

O documento também alerta para o risco de países industrializados não reduzirem drasticamente suas emissões pela queima de combustíveis fósseis, mantendo um modelo de produção e de consumo insustentáveis. “No Brasil, as negociações internacionais sobre clima devem estar focadas na transição para um novo modelo de produção, distribuição e consumo, baseado na agroecologia, na economia solidária e numa matriz energética diversificada e descentralizada” (www.redd-monitor.org/2009/10/15/).

O REDD chegou na grande floresta e precisa ser orientado antes que vire apenas mais um grande negócio de intermediários. A questão colocada é se vai funcionar apenas de forma voluntária entre governos (como ocorre no Fundo Amazônia – www.fundoamazonia.gov.br), como forma de mercado também voluntário ou se vai ser uma compensação de mercado para obrigações dos grandes países poluidores.

Hoje, Brasil e China estão entre os cinco maiores emissores de gases-estufa do planeta mas estão unidos em que as obrigações compulsórias devem ficar apenas com os países industrializados desde o século 19, caso dos Estados Unidos e Europa. Esses são assuntos a serem resolvidos no final do ano, no México.

Antes disso, cabe aos movimentos sociais buscarem meios de orientar setores governamentais e empresariais sobre como deve ser a implantação dos projetos que já estão em andamento na Amazônia Brasileira.

(José Arnaldo de Oliveira, para a Rede GTA – www.gta.org.br)

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