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Araguaia Xingu: o berço da Transformação Socioambiental

Rodrigo Gravina Prates Junqueira* – A Campanha Y Ikatu Xingu (www.yikatuxingu.org.br) não é mais ou menos importante do que outras campanhas que estão em curso no Brasil, mas tem uma peculiaridade: tenta costurar, no seu território alvo – o conhecido Araguaia Xingu, o apoio de todos os setores interessados, independentemente de onde estejam situados em relação aos governos e aos demais conflitos regionais.

A hipótese política da campanha é a de que a união com foco objetivo entre os atores relevantes em um mesmo território deve mudar essa conta. Favorece que as energias e recursos disponíveis pelas partes se orientem para o objetivo comum, e que os governos disponham das melhores condições para superar a esquizofrenia e somar na mesma direção. Qualquer investimento numa região coesa e mobilizada deve levar, supostamente, aos melhores resultados.

Assim, a campanha inverte a lógica habitual das mobilizações sociais, que é a de pressionar facções da burocracia por vantagem comparativa em relação a outros setores, e que, no caso, passa por construir consensos delimitados, porém, hegemônicos na base da sociedade, para fazer o que cada um pode e requerer ações mais consistentes dos poderes públicos. O Estado não é sequer o alvo da campanha – que é a situação de fato – embora dele se espera que também faça a sua parte, que não é pequena, na proporção da sua responsabilidade histórica pela situação e dos meios de que dispõe para ajudar a transformá-la.

Ocorre que o Araguaia Xingu é um símbolo do Brasil. A degradação nas suas cabeceiras começa a aparecer pontualmente na mídia nacional e internacional. A mensagem da campanha já é conhecida entre instituições da sociedade civil, autoridades públicas e formadores de opinião. Falta ela chegar ao conjunto dos brasileiros que têm o Araguaia – Xingu como valor e fazer com que a expressão política deles mostre aos governantes que o desejo de tê-lo limpo e para sempre, não é apenas dos índios e dos habitantes das suas cabeceiras, mas do nosso povo como um todo. É o desdobramento de ações da campanha no plano nacional que poderá assegurar uma correlação de forças mais favorável às suas demandas.

A Amazônia é um espaço de dimensões continentais em disputa. Interesses, opiniões, expectativas e mitos – locais, nacionais e planetários – se sobrepõem para tentar influir sobre o seu destino. Há a visão daqueles que preferem uma Amazônia intocada, com as suas exuberantes florestas contínuas, tendo na pesquisa científica a sua principal atividade e finalidade, que valorizam a sua importância para a regulação do clima e como estoque de recursos naturais que poderão ser imprescindíveis para nós e a humanidade.

Há, também, a visão daqueles que vêem a Amazônia como futuro celeiro da humanidade, e que, sinceramente, gostariam que ela fosse transformada em um contínuo de plantações e pastagens, numa paisagem humanizada, num território definitivamente incorporado à produção e à civilização. Vêem a floresta como um vazio pré-histórico, uma ausência de trabalho, um obstáculo ao projeto nacional. Acreditam que todos teriam a ganhar com a sua conversão à economia de escala, e que esta será indispensável para alimentar a super população do planeta.

Nas discussões entre os diversos setores que participam da campanha tem sido recorrente a idéia de que a região do Araguaia Xingu pode ser um laboratório do desenvolvimento sustentável. Que aqui poderiam ser experimentadas novas soluções e arranjos entre a produção agropecuária de escala, a produção familiar e a conservação de recursos naturais básicos. Os produtores afirmam que gostariam de desenvolver modelos que assegurassem o seu rendimento e os protegessem do protecionismo ambiental que vêem emergir no mercado internacional. Ambientalistas e índios imaginam que corredores florestais contínuos, ao longo da bacia e conectando áreas protegidas, poderiam assegurar a perenidade do ecossistema regional e dos valores culturais associados. Agricultores familiares querem garantir a viabilidade econômica dos assentamentos rurais de reforma agrária com justiça e igualdade de condições.

Para alguns, a campanha poderia ser um passaporte para conquistar o céu, enquanto que para outros ela seria um veículo para poder chegar ao chão. A vontade de um povo pode remover montanhas e mobilizar energias desconhecidas do cotidiano. Poderia, também, construir cenários qualitativamente melhores do que os que têm resultado do conflituoso processo de ocupação da Amazônia. Será necessário muito apoio e muita vontade, mas essa região poderá passar, do conhecido Vale dos Esquecidos, para se transformar num mosaico sadio de plantações diversificadas e pastagens produtivas com áreas protegidas íntegras, extensas e conectadas.

* Engenheiro Agrônomo, Coordenador Adjunto do Programa Xingu do Instituto Socioambiental (ISA). E-mail: rodrigojunqueira@socioambiental.org – tel. 66 3478-3491

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