Vilmar S. Berna* – A crise ambiental exige um novo pacto civilizatório, onde todos serão chamados a contribuir e não apenas as nações ou as empresas. Mais que uma mudança de modelo de desenvolvimento econômico, precisamos de uma mudança cultural e mesmo espiritual em nossa forma de ver e lidar com o planeta, com as outras espécies e com nós mesmos. Resta torcermos para que o Planeta agüente até lá antes de entrar em colapso.
Finalmente, parece que as questões ambientais deixaram definitivamente de ser um tema restrito a ambientalistas para preocupar a toda a sociedade. E mais. O problema ambiental começa a ser visto corretamente, não mais como algo que atinge apenas plantas e os bichos, mas que afeta a sobrevivência e a qualidade de vida de nossa própria espécie. Parece pouco, mas não é. Uma sociedade mais consciente significa, por exemplo, que os políticos se sentirão obrigados a corresponder a esta nova expectativa, e uma evidência concreta desse despertar aparece na adesão recorde à Frente Ambientalista Parlamentar proposta pelo Deputado Sarney Filho. Em poucas horas quase 250 deputados assinaram o manifesto propondo a criação da Frente.
Dois fatores têm ajudado nessa tomada de consciência ambiental da sociedade. Um foi o papel dos cientistas, cada vez mais próximos do consenso sobre a gravidade do problema ambiental para a humanidade. Este mês, 2.500 cientistas de 130 países confirmam que até 2100, dependendo da intensidade das emissões de poluentes, a temperatura média da Terra oscilará entre 1,8ºC e 4ºC e que o nível dos oceanos deve subir entre 18 a 59 cm até 2100, podendo ainda ser maior com o degelo das calotas polares. Cinco dos seis anos mais quentes da história foram a seqüência de 2001 a 2005. As concentrações de CO2 estão 30% mais altas que a média dos últimos 650 mil anos.
O outro, é que a pauta ambiental deixou de ser um tema apenas da mídia ambiental para chegar definitivamente à redação dos grandes veículos de comunicação de massa. Nestas duas décadas em que a questão ambiental foi tratada com desdém, descaso e como um assunto de menor importância, a mídia ambiental conseguiu a duras penas, sem recursos de publicidade, manter pelo menos aqueles segmentos mais sensíveis e interessados da sociedade informados sobre a questão ambiental. Só a Revista do Meio Ambiente desde a sua fundação, em janeiro de 1996, distribuiu, gratuitamente, mais de 2 milhões de exemplares, e o www.portaldomeioambiente.org.br tem mantido a média anual de quase 2 milhões de acesso ao ano!
A chamada grande mídia incluiu definitivamente o tema ambiental em sua pauta e não como um assunto setorial. Só para citar a TV Globo, o Fantástico tem dedicado, não um domingo, mas vários domingos ao assunto do aquecimento global e suas conseqüências. A Globo chega aos lares de mais da metade da população brasileira. A Globo tem ainda dedicado diversos programas ao tema ambiental, e merece destaque a Globo News com as séries conduzidas pelo jornalista André Trigueiro, que lançou recentemente um livro sobre sustentabilidade.
Entretanto, estamos longe ainda das mudanças que o Planeta precisa. Nas últimas eleições presidenciais, por exemplo, o tema ambiental foi tratado com tão pouca importância e prioridade pelos dois candidatos que disputaram o segundo turno das eleições, que parece que o Brasil não pertence ao Planeta Terra. Só se ouviu falar em crescimento, crescimento e crescimento, onde a legislação ambiental e as atuais estruturas de controle e licenciamento ambiental foram incluídas na lista de entraves ao crescimento. É correto preocupar-se com o crescimento, por que milhões de pessoas das atuais gerações e das futuras têm todo o direito de pressionar por moradia, alimentação, saúde, educação, acesso a geladeira, televisão, etc. E tudo isso tem de sair de algum lugar, do Planeta, naturalmente, e a ele retornará na forma de lixo e degradação ambiental. Mas a luta contra a poluição e a degradação ambiental é muito mais que apenas cuidar dos ecossistemas. Ela inclui também a luta contra o modelo perverso de acumulação de riqueza e poder em nome do desenvolvimento, que usa o argumento de atender a justa necessidade das pessoas para justificar, continuar e ampliar o saque sobre o Planeta. A destruição da natureza tem servido para o enriquecimento de poucos, enquanto os prejuízos ambientais são socializados para todos. E os mais pobres e miseráveis são os mais prejudicados, pois não têm como se mudar de locais insalubres e poluídos.
É importante que se diga que apesar de ser um passo importante, a tomada de consciência ambiental não é um processo igual para todos, muito menos afeta a todos de maneira igual. Uns acham que o problema ambiental é grande demais para os indivíduos e que a solução cabe às nações, às empresas, às organizações, aos políticos. Tem gente que prefere acreditar que a Ciência e da tecnologia serão capazes de encontrar a tempo respostas e soluções para nossos problemas ambientais. Outros acham que a mudança ambiental está no poder do consumidor, na mudança de comportamentos e atitudes individuais, ou comodamente prefere acreditar que começa no outro, por exemplo, nos políticos, nas autoridades, nos empresários, nos vizinhos. Outros ainda vêem no agravamento dos problemas ambientais o sinal do Juízo Final, o Armagedom bíblico, quando o próprio Deus irá restabelecer o paraíso aqui na Terra mesmo, limpando o Planeta de toda a sujeira e impureza, o que inclui tanto a poluição e a degradação ambiental quanto os pecadores. Então, pouco se pode fazer pelo Planeta e o melhor mesmo é rezar por misericórdia e promover mudanças que salvem as almas. Talvez todos tenham um pouco de razão.
* Vilmar é escritor com 15 livros publicados. Em 1999, recebeu no Japão o Prêmio Global 500 da ONU Para o Meio Ambiente. É fundador e superintendente executivo da REBIA – Rede Brasileira de Informação Ambiental (www.rebia.org.br ) e editor do Portal ( www.portaldomeioambiente.org.br ) e da Revista do Meio Ambiente (www.revistadomeioambiente.org.br ).