Após 20 anos, índios voltam a extrair látex

A queda no preço da matéria-prima da borracha é o motivo apontado para que os rikbaktsa terem ficado tanto tempo longe de seringueiras

PNUD – Uma comunidade indígena distribuída por 34 aldeias e 400 mil hectares no Noroeste do Mato Grosso está retomando, depois de duas décadas, a extração de látex em seringueiras nativas da região. Beneficiados por projeto co-gerido por representantes da Secretaria de Meio Ambiente do Estado, da Petrobras, da Michelin e do PNUD, os rikbaktsa esperam que haja expansão do número de aldeias na reserva, mais oportunidades de emprego para os jovens e uma renda fixa no período de seca — nos primeiros meses do ano, os índios concentram-se no recolhimento da safra de castanha-do-brasil.

As atividades de retirada da matéria-prima da borracha já começaram. A dificuldade de encontrar compradores e a queda do valor do látex, com a competição internacional, são os motivos apontados para que os rikbaktsa e outras comunidades da região tenham ficado tanto tempo afastados das seringueiras. Por meio de parcerias estabelecidas pelo Projeto de Conservação e Uso Sustentável da Biodiversidade das Florestas do Noroeste de Mato Grosso, no entanto, os índios receberam treinamento e material necessários para tornar a atividade novamente viável.

Mas a principal engrenagem para que a extração fosse reativada foi um acordo fechado com a Michelin do Brasil, que se comprometeu a pagar o maior valor praticado no Mato Grosso pelo látex recolhido pelos índios. A expectativa é que os rikbaktsa ganhem R$ 2,10 pelo quilo da matéria-prima.

As atividades extrativistas têm até o momento 170 famílias envolvidas. Com materiais fornecidos pelo projeto, os índios já abriram 10 mil pés de seringueiras nativas e estão preparados para abrir mais dez mil. A expectativa é de que outros 20 mil árvores sejam usadas na extração do látex nos próximos meses.

Como o trabalho está em sua fase inicial, ainda não há estimativas sobre a quantidade da matéria-prima que vai ser retirada nesta nova fase de extração na reserva. Mas o número deve superar o de 20 anos atrás, quando os índios tiravam 8 toneladas de látex todos os meses. Em relação à renda obtida por família, envolvidos no projeto apostam em valores que superem R$ 800 por família.

“Números ainda não-oficiais com que estamos trabalhando dão conta de uma renda entre R$ 1.200 e R$ 1.500 todo mês”, afirma engenheiro agrônomo João Manoel Peres, coordenador local do projeto Petrobras Ambiental – de Adversários a Parceiros, que é um dos patrocinadores da iniciativa. “É uma previsão otimista, mas muito responsável.”

A parceria entre índios, governo do Estado, Petrobras e Michelin foi estabelecida no ano passado, mas só foi possível distribuir o material para extração nos últimos três meses. “Estamos falando de 34 aldeias e, da primeira à última, aproximadamente 400 quilômetros. Não seria possível dar treinamento e distribuir material a todos em uma semana”, acrescenta Peres.

Benefícios permanentes

Os rikbaktsa estão encarando a possibilidade de voltar a extrair látex da floresta no Mato Grosso como uma grande oportunidade para geração de renda, expansão do número de aldeias e oferta de trabalho para os jovens, tudo isso dentro de uma proposta que garante a conservação e o uso sustentável da floresta.

Nos primeiros meses do ano, os índios têm se concentrado no recolhimento de castanha-do-brasil. “Mas a safra é periódica e, depois, temos de procurar outras atividades para geração de renda”, conta o índio Paulo Skiripi, presidente da Associação do Povo Indígena Rikbaktsa. “Acabada a época da castanha, boa parte dos jovens das aldeias saía de casa para trabalhar como peão em fazendas. Agora, em vez de fazer isso, eles estão trabalhando na retirada de látex”, acrescenta Peres.

“Nossa grande preocupação é manter nossos jovens dentro da aldeia, próximo da sua família, sua cultura e seu idioma, da terra e de sua conservação”, afirma Sikiripi. Ele espera que essa parceria traga benefícios permanentes aos rikbaktsa, como a conservação da floresta e a expansão das aldeias da tribo. “Hoje, existem aldeias grandes, com cento e poucas famílias, e aldeias menores e com longas distâncias entre elas. A extração de látex nativo deve expandir também as aldeias e facilitar a fiscalização permanente das terras”, completa o indígena.

Parcerias

O Projeto de Conservação e Uso Sustentável da Biodiversidade das Florestas do Noroeste de Mato Grosso, apelidado de GEF Noroeste e administrado pelo PNUD, está à frente da retomada da extração de látex nessa região do Mato Grosso. Além de dinheiro do Fundo Global para o Meio Ambiente, também participam como patrocinadores do projeto a Michelin e a Petrobras — que destinou R$ 1,8 milhão para o projeto, que incluí a reserva extrativista Guariba Roosevelt e o Assentamento Vale do Amanhecer.

O apoio da estatal é dado através da “União dos Povos da Floresta para Proteção dos Rios Juruena e Aripuanã”, executado pelo Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Aripuanã com patrocínio do Programa Petrobras Ambiental. Foi esse projeto que forneceu aos rikbaktsa todos os equipamentos necessários para a extração do látex.

“O principal papel do GEF Noroeste é trabalhar com articulação interinstitucional e trazer novos parceiros pra essa causa da florestania e de apoiar esses povos da floresta”, afirma Placido Costa, coordenador do Programa de Integrado da Castanha

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