Deputados de MT ignoram estudos técnicos e mobilização popular e já articulam manobras para aprovar PL da Pesca

Projeto apresentado pelo Governo não possui embasamento técnico comprovado, além de não ter passado pela discussão do Cepesca.

Por Bruna Pinheiro / Formad

Apesar da comprovação da falta de estudos técnicos legítimos e uma defesa simplificada por parte do Governo, a aprovação do Projeto de Lei 1363/2023 pode estar próxima. Isto porque deputados estaduais já se articulam com emendas e substitutivos para camuflar os reais impactos do projeto que proíbe a pesca nos rios de Mato Grosso por cinco anos. Em audiência pública realizada nesta terça-feira (13), um “acordo” entre os parlamentares foi confirmado: a votação está marcada para 28 de junho.

A Assembleia Legislativa de Mato Grosso (ALMT) foi tomada por centenas de pescadores de todo o estado que foram até a Casa para acompanhar a audiência pública que discutiu o PL 1363/2023 e durou mais de cinco horas. Do lado de quem é contra o projeto, muitos estudos, levantamentos técnicos, denúncias da falta de participação popular e a flagrante ameaça da proibição aos pescadores.

Já os que se posicionam a favor do PL, a justificativa é pela “mudança de vida” dos pescadores como elemento determinante para proibir a prática em Mato Grosso. “Não queremos outro emprego. Somos pescadores!”, foi uma das palavras de ordem do povo.

A audiência pública contou com a apresentação do pesquisador da Embrapa Pantanal, Agostinho Catella, que fez uma avaliação da estabilidade dos recursos pesqueiros na Bacia do Alto Paraguai apontando que o PL 1363/2023 traz profundos impactos sociais e econômicos negativos para os pescadores, além de inviabilizar a pesca profissional artesanal nas três bacias do estado. Segundo a Nota Técnica da equipe de Recursos Pesqueiros da Embrapa Pantanal, os reflexos do projeto atingiriam diretamente cerca de 40 mil pessoas.

Fizemos o monitoramento da Bacia e notamos que, do ponto de vista quantitativo e qualitativo, a pesca profissional artesanal e amadora permaneceram estáveis, o que significa que não procede a justificativa do PL sobre a redução dos estoques pesqueiros”, explicou Agostinho.

O estudo ainda aponta os questionamentos éticos sobre a modalidade “pesque e solte”, que seria autorizada pelo PL como modelo único para a pesca amadora em Mato Grosso. Dentre as consequências está o comprometimento da segurança alimentar de grande parte dos pescadores menos favorecidos e que têm no peixe o único ou principal alimento.

Quando você proíbe o transporte, está inviabilizando toda a pesca tradicional. Tem que haver uma justificativa ambiental muito forte para tomar essa decisão. Interromper a pesca é interromper uma profissão e não se interrompe dessa forma. O impacto desse projeto é contra uma categoria importante, numerosa, mas frágil”, acrescentou o pesquisador.

Presente na audiência pública, o analista socioambiental do Observatório Socioambiental de Mato Grosso (Observa-MT) e membro do Conselho Estadual de Pesca de Mato Grosso (Cepesca), Rafael Nunes, ressaltou que o PL 1363/2023 não foi discutido pelo órgão, tendo inclusive uma minuta sobre o projeto desconsiderada pelo Governo. Ele também questionou a ausência de estudos científicos sobre a queda no estoque de peixes, como argumenta o projeto.

O projeto foi colocado para votação sem dados científicos e coleta em todas as bacias. O Estado toma uma decisão de eliminar a possibilidade de uma atividade, sem discussão popular. O relatório apresentado para defender o projeto traz uma amostragem de 70 pescadores na Baixada Cuiabana. E quantos pescadores temos aqui hoje? O que estamos observando é o poder coercitivo do Estado ao impedir o livre exercício das pessoas”, alertou Rafael.

O relatório citado pelo analista socioambiental é um documento apresentado pelo consultor técnico em turismo de pesca esportiva, Kelven Lopes, e favorável ao projeto. O material foi chamado de “pesquisa de opinião” pelo deputado estadual Wilson Santos por não possuir embasamento científico, tampouco é reconhecido por instituições de referência.

Votação do PL segue marcada

Encerrada a discussão, o deputado federal Lúdio Cabral propôs como encaminhamento que o PL 1363/2023 fosse retirado de pauta na sessão plenária desta quarta-feira (14), além da exclusão do regime de urgência do projeto, que já foi aprovado em primeira votação no dia 2 de junho. O parlamentar solicitou também que todos os documentos apresentados na audiência sejam anexados ao processo para apreciação dos deputados.

Retirado da sessão, o PL 1363/2023 já está com votação marcada para o dia 28 de junho, no entanto, deputados estaduais articulam emendas e substitutivos para viabilizar a sua aprovação. Até lá, os parlamentares favoráveis terão tempo para maquiar a proposta que, de fato, coloca em risco o modo de vida de milhares de pescadores em Mato Grosso, ameaça a soberania alimentar de suas famílias e ignora a mobilização popular e instâncias deliberativas.

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