Risco previdenciário pode levar à inconstitucionalidade do Cota Zero pelo STF; audiência está marcada para amanhã (02)

Ministro André Mendonça é quem analisa o caso no Supremo.

Por Bruna Pinheiro / Formad

Quase um mês depois da primeira data marcada, a audiência de conciliação convocada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) para discutir a inconstitucionalidade do Cota Zero deve acontecer. A reunião está marcada para às 10h (horário de Brasília) desta terça-feira (02), na sede do Supremo na capital federal. A Lei que proíbe o armazenamento, comércio e transporte do pescado em Mato Grosso por cinco anos é alvo de três ações de inconstitucionalidade, sob relatoria do ministro André Mendonça. Entre os principais argumentos utilizados está o risco previdenciário da proibição, com a perda de benefícios sociais para mais de 16 mil famílias de pescadoras e pescadores, além da ausência de estudos técnicos que atestem a redução do estoque pesqueiro, como argumenta o Governo estadual.

Para esta rodada da conciliação, foram convocadas as mesmas instituições estaduais e federais participantes da primeira audiência, em janeiro. Parte delas, inclusive, já se posicionou contra à Lei. “Desde o início da tramitação alertamos sobre o racismo ambiental, a ausência de estudos técnicos, de diálogo com as populações envolvidas, do risco à aposentadoria e benefícios sociais e outros argumentos que atestam a inconstitucionalidade do Cota Zero. Sabemos as verdadeiras intenções do Governo de Mato Grosso em extinguir um modo de vida que hoje representa a resistência e proteção de nossas bacias. Neste quase um ano de luta pela derrubada do Cota Zero, uma série de documentos técnicos e manifestações foram apresentadas, enquanto o Governo segue sem argumentos plausíveis”, afirma o secretário executivo do Fórum Popular Socioambiental de Mato Grosso (Formad), Herman Oliveira.

Já se posicionaram contra a Lei instituições estaduais e federais importantes como a Advocacia Geral da União (AGU), Associação Juízas e Juízes para a Democracia, Conselho Nacional de Povos e Comunidades Tradicionais, Defensoria Pública da União (DPU), INSS, Ministério da Pesca e Aquicultura, Procuradoria Nacional de Defesa do Clima e do Meio Ambiente, Procuradoria-Geral da República e Sociedade Brasileira de Ictiologia.

Lista de 12 espécies não é a saída

Antes mesmo de ser apreciada pelo STF, a proposta de 12 espécies proibidas foi publicada pelo Governo de Mato Grosso em forma de decreto, sendo transformada logo em seguida no Projeto de Lei 27/2024, que acabou aprovado pela maioria dos deputados estaduais no dia 28 de fevereiro. Mais uma vez, a celeridade da ALMT para passar um projeto do Governo chama a atenção.

Um dos principais órgãos com atribuições sobre as questões previdenciárias no Brasil, o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) alertou a respeito das consequências da restrição. A instituição, que também é convocada pelo STF para analisar a Lei, foi provocada pela Advocacia-Geral da União (AGU) para responder se a lista de 12 espécies sanaria os problemas levantados pela entidade, entre eles, a preocupação quanto a perda de benefícios sociais com a descaracterização de pescadoras e pescadores na categoria de “segurado especial”.

Segundo a Divisão de Seguro-Desemprego do Pescador Artesanal do INSS, “o recebimento por parte do pescador profissional artesanal do auxílio pecuniário, conflita com as regras de concessão do seguro defeso, considerando que o requerente não pode dispor de qualquer fonte de renda diversa da decorrente da atividade pesqueira referente às espécies objeto do defeso. (…) Assim, entendemos que os pescadores beneficiários não farão jus ao seguro desemprego do pescador artesanal”.

De acordo com a manifestação da AGU, o Decreto Estadual nº 677, de 1º de fevereiro de 2024 e a proposta de conciliação “não são suficientes para sanar a inconstitucionalidade presente na legislação impugnada e nem para solucionar as graves consequências impostas aos pescadores artesanais”. Isto porque, a lista de 12 espécies proposta pelo Governo de Mato Grosso representa cerca de 90% da produção desembarcada de pescado, o que se mantida afeta diretamente “o núcleo essencial ao direito à cultura, à livre iniciativa e à dignidade da pessoa humana se mantém, bem como a desproporcionalidade do ônus imposto a uma das muitas atividades que impactam os estoques pesqueiros”.

Inconstitucionalidade

A ação direta de inconstitucionalidade 7471 é de autoria do Movimento Democrático Brasileiro (MDB), com o pedido de suspensão de efeitos da Lei 12.197/2023. Além dessa, outras duas ações (7514 e 7590) foram ingressadas no STF pelo Partido Social Democrático (PSD) e a Confederação Nacional dos Pescadores (CNP), respectivamente.

Representando organizações da sociedade civil no processo, as advogadas Bruna Bolzani, do Formad, e Edilene Amaral, do Observatório Socioambiental de Mato Grosso (Observa-MT), acreditam na inconstitucionalidade do Cota Zero.  “O acordo feito na primeira audiência era de que deveria haver um diálogo entre o Governo de Mato Grosso e os ministérios da Pesca e do Meio Ambiente, Ibama, AGU e INSS, o que não aconteceu. A lista de 12 espécies proibidas representa 90% da produção de pescado e é arbitrária, pois não tem nenhuma evidência ou estudo científico como embasamento e certamente será rejeitada pelas demais instituições convocadas pelo STF”, ressalta Bruna Bolzani.

“Se o Estado tivesse segurança jurídica e embasamento científico a respeito da proposta, faria de tudo para que ela fosse rapidamente analisada e aceita. Seguimos acreditando na derrubada da Lei, até porque todos os órgãos envolvidos já analisaram a proposta, posto que o Governador já as apresentou em forma de Decretos, então as análises e rejeições já se encontram nos autos”, finaliza Edilene Amaral.

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