Por Bruna Pinheiro / Formad
Por que ignorar a ciência e impor a pior medida para o Parque Nacional de Chapada dos Guimarães e a população? Esse é um dos questionamentos levantados pelo documentário “Portão do Inferno: patrimônio em risco”, lançado nesta quarta-feira (18) e que traz relatos de moradores e comerciantes sobre os impactos das intervenções comandadas pelo governo de Mato Grosso antes mesmo do início das obras de retaludamento na MT-251, no segundo semestre deste ano.
A proposta do documentário é dar voz a parte da população que já vem sofrendo com as alterações no tráfego na rodovia, incluindo as interdições durante o dia para a execução de obras, além dos impactos socioambientais do retaludamento e o funcionamento do Parque Nacional de Chapada dos Guimarães. Para arqueólogos e pesquisadores, a alternativa escolhida pelo governo estadual não é viável e tem tudo para provocar enormes prejuízos.
A obra de retaludamento foi anunciada pelo governo de Mato Grosso em junho de 2024, apesar de uma série de irregularidades e contradições, como ressalta a jornalista e moradora de Chapada dos Guimarães, Andreia Fanzeres. “O licenciamento ambiental não teve um termo de referência para o empreendedor apresentar estudos que o órgão ambiental pede. Então como o órgão ambiental vai poder dizer se os estudos são suficientes?”. Outro fato que chama a atenção é a contratação sem licitação por parte do governo do estado e antes da licença ambiental ser expedida.
De acordo com o Governo de Mato Grosso, a obra está orçada em R$ 30 milhões, com prazo de execução de 120 dias, que já foi ultrapassado e sem o atendimento às 21 condicionantes ambientais exigidas pelo Ibama e o ICMBio. A empresa responsável é a Lotufo Engenharia e Construções, ligada ao senador e ex-chefe da Casa Civil Mauro Carvalho Júnior. O contrato foi viabilizado com dispensa de licitação, ou seja, não houve concorrência e apresentação de outras propostas, condições e valores.
Se por um lado, alguns estão ganhando muito dinheiro, para outros a situação é preocupante. Demissões, baixa no número de pacotes de passeios e até fechamento de estabelecimentos comerciais são só alguns dos impactos já sofridos pela população local. “Para quem depende realmente do turismo está sendo muito pesado. Eu reduzi o meu quadro de funcionários para quatro, éramos nove. Esse impacto agora no final do ano vai ser muito grande”, lamenta a empresária Flávia Cintra.
#SOSChapada
À época do anúncio, o Fórum Popular Socioambiental de Mato Grosso (Formad) e o Observatório Socioambiental de Mato Grosso (Observa-MT) produziram nota técnica com um alerta sobre os riscos da obra, bem como uma campanha chamando atenção sobre o caso, incluindo a divulgação de um abaixo-assinado promovido pelo Movimento de Moradores de Chapada dos Guimarães e que já conta com mais de 17,3 mil assinaturas.
Em setembro, uma Ação Civil Pública foi ajuizada pela sociedade civil organizada requerendo a suspensão das licenças e obras de retaludamento até a realização de perícia no local, para atestar a situação emergencial com relação à queda de blocos no trecho da rodovia, e a indicação de alternativas locacionais menos impactantes. No mês seguinte, o Ministério Público Federal (MPF) e o Ministério Público do Estado (MP-MT) pediram a suspensão imediata das obras devido a irregularidades. Até o momento, o governo estadual não se posicionou sobre a medida e alguns serviços seguem em execução na rodovia.
“Portão do Inferno: patrimônio em risco”
O documentário é dirigido por Laércio Miranda e Dafne Spolti, realizado pelo Formad e pelo Movimento de Moradores de Chapada dos Guimarães, com apoio do Observa-MT. Participam das entrevistas a empresária Flávia Cintra, a jornalista Andreia Fanzeres, a arqueóloga Suzana Hirooka, o geólogo Prudêncio Castro Júnior e a guia de turismo Marcia Bortoluzzi. O vídeo também conta com imagens do fotógrafo Mario Friedlander. Para assistir, acesse o canal do Formad no Youtube.
Link disponível: https://www.youtube.com/watch?v=bauGyYLrnmY
Foto: Mario Friedlander