Proposta de ampliação da Estação Ecológica de Taiamã é defendida por pesquisadores, estudantes, pescadores e sociedade civil

Unidade de Conservação em Cáceres (MT) pode ter aumento na área protegida para quase 57 mil hectares.

Por Bruna Pinheiro / Formad

A pressão do setor ruralista não foi suficiente para silenciar as manifestações favoráveis à ampliação da Estação Ecológica de Taiamã, na região do Pantanal Norte de Mato Grosso. A tentativa fez parte da consulta pública – uma das etapas do processo de criação/ampliação de Unidades de Conservação do Instituto Chico Mendes de Meio Ambiente (ICMBio), realizada em Cáceres (MT), nesta terça-feira (09.09). A proposta de ampliação de 11,5 mil para quase 57 mil hectares, ao proteger o  bioma contribui decisivamente com a salvaguarda de espécies endêmicas e manutenção do estoque pesqueiro por ser berçário dos peixes da bacia hidrográfica. Além disso, tem reflexos diretos e positivos de alta na arrecadação do ICMS Ecológico, melhoria nos índices socioeconômicos provenientes do pescado e se revertem em benefício da cidade.

Maria Helena Reinhardt, do ICMBio / Foto: Bruna Pinheiro

A apresentação do projeto de ampliação foi conduzida pela analista ambiental e Coordenadora da Diretoria de Criação e Manejo de Unidades de Conservação (DIMAN) do ICMBio, Maria Helena Reinhardt, que deu o contexto histórico e técnico sobre as condicionantes de um processo de criação e/ou ampliação de Unidades de Conservação, conforme a legislação brasileira.

Entre os pontos de destaque do projeto está a perspectiva de proteção de áreas de alta relevância ecológica; segurança de espécies ameaçadas; promoção da conservação de ambientes aquáticos (rios, lagos, baías e corixos) e associados (matas alagadas, campos inundados e praias); ampliação da capacidade de fiscalização e controle de incêndios, além do potencial de diminuição da degradação de áreas úmidas críticas na região. A proposta não altera as áreas de pesca, uma vez que a ampliação está inserida nos polígonos de exclusão, onde a atividade já é proibida desde 2009.

É curioso como os ruralistas, que tanto se beneficiam e foram favoráveis ao Cota Zero, por exemplo, uma lei estadual que proíbe a pesca por cinco anos, tentaram usar a proposta de Taiamã para enganar as colônias de pesca. Na tentativa de trazer esse grupo para se unir contra o projeto, foram disseminadas falsas informações sobre a proibição e que a ampliação afetaria o estoque pesqueiro, prejudicando ainda mais as pescadoras e pescadores. Onde estavam esses mesmos fazendeiros e empresários quando o governo fez de tudo para aprovar o Cota Zero?”, salienta o secretário executivo do Fórum Popular Socioambiental de Mato Grosso (Formad), Herman Oliveira.

Criada por meio do Decreto 86.061, de 02 de junho de 1981, a Estação Ecológica de Taiamã possui exatos 11.554,98 hectares, na região do Pantanal Norte, em Cáceres. O território abrange rios importantes para a biodiversidade pantaneira e o modo de vida tradicional de comunidades do entorno, a exemplo do Rio Paraguai e é considerado o “berço” de muitas espécies, como a onça-pintada, animal de extrema importância para o equilíbrio ecológico do Pantanal.

Além dela, esteve presente na consulta pública, a Diretora do DIMAN-ICMBio, Iara Vasco e integrantes de equipes técnicas do órgão federal. A proposta de ampliação, assinada pelo Instituto, prevê o aumento da área protegida, dos atuais 11.554,98 hectares para 56.918 hectares.

Cartaz de estudantes da UNEMAT / Foto: Bruna Pinheiro

Todas as atividades produtivas precisam que a natureza mantenha seu vigor e sua resiliência”, afirmou Iara Velasco ao ressaltar que a proteção da biodiversidade é condição essencial para o desenvolvimento econômico. Quando aberto para falas da população, representantes do agronegócio chegaram a colocar em dúvida os benefícios de se aumentar uma área de proteção ambiental, alegando prejuízos financeiros com tanta “área sem uso”.  

A consulta pública é uma oportunidade de aprimorar a proposta, e ouvir de fato, os diferentes olhares, os diferentes interesses, as diferentes realidades, para que a gente consiga, coletivamente, construir uma proposta que atenda à necessidade de proteção da natureza, da qual, qualquer atividade econômica depende. E é a universidade, é a ciência que vêm trazendo tantos alertas como soluções baseadas na natureza”, acrescentou.

Em um auditório lotado por estudantes, pesquisadores, pescadoras e pescadores, além de representantes da sociedade civil, dados e estatísticas já comprovados sobre a importância da conservação do Pantanal chegaram a ser questionados por defensores da pecuária, soja e outras atividades exploratórias. Um dos mais importantes biomas para o planeta e rico em biodiversidade, o Pantanal, ainda carece de áreas legalmente protegidas. De acordo com o Painel das Unidades de Conservação Brasileiras do Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima, apenas 4,68% do bioma conta com UCs, sendo 22 delas de uso sustentável e seis como unidades de proteção integral.

Democracia fortalecida

De um lado, empresários e representantes de entidades ligadas ao agro usavam adesivos de “Não à ampliação”, de outro, cartazes, faixas e muitos gritos da juventude, comunidades e da sociedade civil organizada defendendo a proteção e conservação ambiental. “A ampliação já é bem-vinda pelos pescadores artesanais e tradicionais aqui de Cáceres”, disse Lourenço Pereira, da Rede de Comunidades Tradicionais Pantaneira.

Destacando a relevância científica de Taiamã, a Doutora em Ciências Ambientais pela Unemat e coordenadora do Instituto Gaia, Solange Ikeda, também se manifestou sobre a importância da UC. “Temos pesquisadores renomados no Brasil e no mundo, com estudos realizados nessas unidades de conservação. Desde quando eu era estudante da Unemat, sempre tive portas abertas do ICMBio para estudar nessas áreas”.

Além do Instituto Gaia e a Rede de Comunidades Tradicionais Pantaneira, outras filiadas do Formad também participaram da consulta, como a Associação Fé e Vida, Associação Xaraiés, e parceiros nacionais como a Rede PróUC e o SOS Pantanal.  

Com argumentos vazios e sem comprovações, a “turma do agro” levantou dúvidas quanto ao orçamento para execução da ampliação de Taiamã, além de defender que seriam eles os verdadeiros protetores de áreas no Pantanal. Pelo Formad, o secretário executivo destacou a responsabilidade e influência deste segmento na aprovação de leis e previsões orçamentárias.

Com todo o respeito, mas o questionamento sobre a insuficiência de funcionários e recursos para manutenção das Unidades de Conservação não pode ter como único responsável o Poder Executivo Federal e, por extensão, o ICMBio. Na verdade, quem vota e aprova o orçamento é o Poder Legislativo, são os deputados e, nesse sentido, a bancada ruralista é absolutamente responsável pelos problemas de gestão. Cada um vota com a sua própria consciência, mas vocês, que são contrários à ampliação desta Unidade de Conservação, deveriam pensar bem antes de votar!”, frisou Herman Oliveira.

Com a consulta pública realizada, é aberto o prazo de 15 dias para o envio de sugestões, manifestações e documentações da sociedade civil e interessados em alterações na proposta do ICMBio. Para conhecer a proposta de ampliação da Estação Ecológica de Taiamã, acesse: https://www.gov.br/icmbio/pt-br/assuntos/criacao-de-unidades-de-conservacao/lista-de-consultas-publicas/proposta-de-ampliacao-da-estacao-ecologica-de-taiama

Parque Nacional do Pantanal Mato-grossense

Em agosto, outra consulta pública também reuniu representantes de diferentes setores para discutir uma proposta de ampliação de Unidade de Conservação em Mato Grosso. A área envolvida é o Parque Nacional do Pantanal, na região de Poconé e a proposta prevê a ampliação de quase 48 mil hectares. Chamada de “coração do Pantanal”, a área possui alta riqueza hidrológica, diversidade de ictiofauna, registros de sítios arqueológicos e potencial território para a prevenção e combate ao fogo nos períodos de seca. Para garantir a ampliação, seriam adquiridas e anexadas ao Parque, propriedades rurais – em sua maioria, alagadas – consideradas improdutivas. A proposta também conta com a criação de um fundo financeiro para a melhor gestão do parque. A consulta foi realizada em 14 de agosto e o prazo para o envio de manifestações públicas encerrou-se em 31 de agosto.

Foto de capa: Daniel Kantek/ICMBio

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