Por Bruna Pinheiro / Formad
A suspensão dos efeitos da Lei 12.434/2024, que proíbe a pesca de 12 espécies de peixes em Mato Grosso, voltou a ser requerida junto ao Supremo Tribunal Federal (STF). Um agravo interno foi protocolado nesta terça-feira (20), com o objetivo de reconsideração da decisão proferida pelo relator da matéria no Supremo, ministro André Mendonça. Se for mantida a decisão, o recurso deve ser enviado para julgamento em plenário, abrindo a discussão com os demais ministros.
No pedido de agravo, protocolado pelo Movimento Democrático Brasileiro (MDB) na ADI 7471, a decisão sobre a liminar, publicada em 03 de julho, é rebatida em diversos pontos. Entre eles, os argumentos de que a Lei traria proteção ao meio ambiente, que as comunidades e povos atingidos teriam sido consultados e que não faltariam estudos técnicos sobre os estoques pesqueiros nas bacias hidrográficas de Mato Grosso. O argumento do ministro em relação à garantia dos direitos previdenciários das pescadoras e pescadores também foi refutado, com destaque às manifestações e notas técnicas do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) e da Advocacia Geral da União (AGU), que apontam para a perda desses direitos com o recebimento do “auxílio” proposto pelo Governo de Mato Grosso.
Diz um trecho do documento que “o perigo da demora não se faz presente apenas no decaimento exponencial da qualidade de vida da população pescadora, mas, também, na questão previdenciária. A decisão foi fundamentada no sentido de que o auxílio a ser pago pelo governo, teria o caráter indenizatório, o que impediria a exclusão dos pescadores da aposentadoria especial a que têm direito. Todavia, quando esse entendimento se fará valer para a população?”.
Outro ponto de destaque é quanto à consideração do ministro André Mendonça a um único estudo parcial e favorável ao Cota Zero, em detrimento de todas as manifestações e notas técnicas dos órgãos federais envolvidos. Referido estudo foi encomendado pela Assembleia Legislativa de Mato Grosso (ALMT) e apresentada em audiência pública em 13 de junho de 2023 pelo consultor técnico em turismo de pesca esportiva, Kelven Lopes. O levantamento se baseia em entrevistas feitas com menos de 80 pescadores de apenas cinco cidades de Mato Grosso. Até o momento, este é o único “estudo” favorável ao Cota Zero já apresentado publicamente.
“Não se trata de uma ‘divergência entre as opiniões dos especialistas consultados nos níveis estadual e federal que possuem argumentos’, mas, sim, a existência de 1 (um) estudo feito com 78 pescadores de uma região específica, que silencia todos os demais entes e mais de 14 mil pescadores.”, aponta o documento.
O pedido de reconsideração da decisão agravada, com a concessão da medida cautelar para suspensão dos efeitos da Lei, utiliza-se de quatro fundamentos, sendo eles 1) de ordem formal, referente à invasão da competência da União e inaplicabilidade do princípio da predominância interesse; 2) de ordem material, referente à violação de direitos fundamentais dos pescadores e pescadoras, além da equivocada utilização de um único estudo desconsiderando todos os outros argumentos e aporte técnicos; 3) a jurisprudência do STF referente à ADI 7319, que deve servir de referência por sua semelhança já que foi reconhecida a invasão de competência da União quando se proibiu a construção de novos empreendimentos hidrelétricos no Rio Cuiabá, decidindo pela inconstitucionalidade da lei à época; 4) o impacto da norma na população de pescadores, com os efeitos de insegurança alimentar, vulnerabilidade social e até relatos de mortes em comunidades.
Julgamento do recurso em plenário dá esperanças de derrubada da Lei
Em caso de manutenção da decisão pelo ministro André Mendonça, o processo deve ser encaminhado para julgamento em plenário, cabendo aos outros ministros do STF lerem e analisarem os documentos, pareceres, notas técnicas e manifestações dos órgãos federais envolvidos, todos unânimes acerca da inconstitucionalidade da Lei. Desde que assumiu a relatoria do caso, o ministro André Mendonça tem sido irredutível em decidir pela inconstitucionalidade da Lei, não acolhendo nenhum dos argumentos técnicos, manifestações da sociedade civil e das populações atingidas.
O ministro chegou a abrir uma fase conciliatória entre as partes, mas o governo de Mato Grosso rejeitou a proposta do Ministério da Pesca e Aquicultura de suspensão das leis para elaboração de um plano de gestão em parceria entre os órgãos federais e estaduais. Já a alternativa do governo de Mato Grosso foi de flexibilizar a proibição, instituindo, sem estudos técnicos, uma lista de 12 espécies de peixes proibidas de pescar. Essa alternativa foi rejeitada pelos órgãos federais, uma vez que a “saída” não sanaria as inconstitucionalidades da Lei.
O último despacho referente ao Cota Zero no STF é de 03 de julho. Nele, além de rejeitar os pedidos de suspensão dos efeitos da Lei, o ministro André Mendonça adiantou que ainda analisaria o pedido de ingresso de quatro organizações como amicus curiae no processo, entre elas está o Fórum Popular Socioambiental de Mato Grosso (Formad), que acompanha o caso desde o início. O julgamento final das três ações diretas de inconstitucionalidade em tramitação no Supremo ainda não tem data marcada.