Folha de S. Paulo – A política de combate ao desmatamento do governo Lula isentou assentados da reforma agrária e pequenos produtores rurais nos 36 municípios que mais abatem árvores na Amazônia do risco de bloqueio de crédito e de dificuldades de comercialização de seus produtos nos próximos anos. Isso foi feito apesar dos estudos que atribuem aos assentados e proprietários de até 100 hectares a responsabilidade por 15% a 18% da devastação da floresta.
Decreto editado por Luiz Inácio Lula da Silva estabeleceu prazo de dois anos, “prorrogável por mais um ano”, para a indicação da posição geográfica precisa dos imóveis até 400 hectares. O georreferenciamento é a base para o governo monitorar o desmatamento e punir os responsáveis até com o embargo da produção.
Nos municípios que mais desmataram a Amazônia, as pequenas propriedades e assentamentos somam 10,2 milhões de hectares, o equivalente a 13% de seu território. Os demais imóveis rurais terão até meados de março para apresentar os documentos sem enfrentar problemas.
“O decreto alcança [os assentados e pequenos produtores], mas num segundo momento”, disse a ministra Marina Silva (Meio Ambiente). Ela justificou a opção: “A sociedade brasileira sempre disse: vocês não conseguem combater o desmatamento porque só fiscalizam os pequenos. A nossa estratégia foi priorizar os grandes”.
Nos 36 municípios listados como alvo das ações de combate ao desmatamento, 8,3% da área total está em projetos de reforma agrária. São 279 assentamentos, com 6,5 milhões de hectares. Cinco deles -Coutinho União, Pingos D’água, São Manoel e Brasil Novo, em Querência (MT), e Rio Campo Alegre, em Santana do Araguaia (PA)- tiveram no mínimo 1 km2 (até 16,34 km2) de desmate apenas em novembro de 2007. Esse foi o mês mais crítico do período coberto pelo último alerta do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais).
Latifúndios e grileiros
“A reforma agrária ajuda na preservação da floresta; todos os especialistas, eu, a ministra Marina e o governo acreditamos nisso”, insiste Guilherme Cassel (Desenvolvimento Agrário). Para o ministro, o desmatamento é provocado por “latifundiários, madeireiros e grileiros”. O ministério informa que caiu em 51,2% o desmatamento nos assentamentos entre 2006 e 2007, de acordo com dados do Inpe.
Mas estudo apresentado há um ano e meio pelo Imazon (Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia) apurou que o ritmo de abate de árvores nos assentamentos (1,8% ano ano) era quatro vezes maior se comparado à taxa média de desmatamento na Amazônia. O estudo estimou em 15% a participação dos assentamentos na devastação da floresta até 2004. Mostrou ainda que 43% dos assentamentos mapeados apresentaram mais de 75% de sua área desmatada.
Em auditoria votada em dezembro, o TCU (Tribunal de Contas da União) cobrou medidas para conter a multiplicação de assentamentos sem controle ambiental na Amazônia, como forma de reduzir a devastação da floresta. De acordo com a auditoria, propriedades com até 100 hectares são responsáveis por 18% do desmatamento. “Esses dados se mostram alarmantes, na medida em que o número de famílias assentadas na região com lotes dessa dimensão chega a 750 mil, o que pode representar grandes ameaças de futuras degradações ao meio ambiente”, relatou o ministro Aroldo Cedraz.
O TCU determinou ao Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária) que não promova assentamentos sem licença prévia ambiental. Em toda a Amazônia Legal, foram assentadas 535 mil famílias, segundo o Ministério do Desenvolvimento Agrário. Na região, a lei autoriza o desmatamento de até 20% dos lotes.