Instituto Socioambiental aponta risco para o Xingu com expansão prevista para soja

Enquanto IBGE diz que expansão será em áreas já abertas

Agência Brasil – O coordenador do Programa Xingu, do Instituto Sociambiental (ISA), André Villas-Bôas, discorda da previsão de que um crescimento da soja no Mato Grosso este ano aconteceria essencialmente em áreas já ocupadas, sem ameaçar, assim, o Parque Indígena do Xingu.

Em entrevista à Agência Brasil, o supervisor de Estatística Agropecuária do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) no estado, Fernando Marques de Figueiredo, apontou a melhora na cotação do produto na Bolsa de Chicago (EUA) e disse que, em território mato-grossense, deve haver avanço da sojicultura concentrado em áreas colocadas em descanso, locais com produtividade menor ou pastagens, ou ainda em substituição a outras lavouras – em geral, arroz.  Disse, ainda, que a situação do entorno do parque tende à estabilidade no que diz respeito a desmatamento.

Para André Villas-Bôas, do ISA, existe a possibilidade de que a expansão, se confirmada, aproveite áreas já abertas.  Ele prevê, no entanto, que o processo incluiria um percentual de desmatamento e um processo de expulsão da pecuária para municípios mais ao norte, com abertura de novas áreas.  “O Xingu está numa região que vem sendo muito procurada pelo agronegócio, porque é plana e coberta em boa parte por solos vermelhos, além de contar com e uma variação climática muito apropriada, com períodos muito definidos de chuva”, comenta.

“É uma conjunção perfeita”, diz.  “É tudo o que a agricultura mecanizada quer.  O mercado de terra ali está se aquecendo, não só pelo preço da soja, mas também por causa do biocombustível.”  Ele avalia que o grau de preservação do patrimônio natural do estado vai depender da atuação do poder público, mas lembra que em muitas propriedades ainda existem áreas que, legalmente, podem ser desmatadas.

O instituto e parceiros trabalham, desde 2004, com a campanha ‘Y Ikatu Xingu, que visa à recuperação das nascentes da região – muitos dos rios que formam o Xingu nascem fora do território indígena.  Entre as estratégias da iniciativa, que tem como meta recuperar 300 mil hectares degradados de mata ciliar (que margeia cursos d’água), estão a capacitação de lideranças e a promoção do desenvolvimento sustentável por intermédio da mídia local e de escolas.  Além disso, há cerca de 20 projetos pilotos buscando estabelecer formas de recuperação de vegetação adequadas para pequenas e grandes propriedades e assentamentos de reforma agrária.

Coordenador de programa no Xingu identifica avanço na preservação de nascentes

Aldeia Ipatse (Parque Indígena do Xingu) – Índio kuikuro ajeita esteira com peixe moqueado em fim de semana de comemorações no local.  Pelo processo, os peixes são assados e defumados durante horas Brasília – Embora manifeste preocupação diante da expansão prevista para a soja no Mato Grosso, o coordenador do Programa Xingu, do Instituto Sociambiental (ISA), André Villas-Bôas, aponta um aumento na conscientização no estado sobre a importância de preservar os recursos hídricos.

“Você começa a notar um consenso de que isso é básico, e um entendimento claro de que água é uma questão econômica”, diz o antropólogo, que destaca a existência de diferentes graus no processo de colonização no estado.  Ele diz que em parte das ocupações recentes se verifica uma preocupação maior com os parâmetros ambientais, que se reflete num planejamento mais cuidadoso da propriedade rural.  “Mais ao sul, onde estão os maiores passivos ambientais [isto é, mais degradação a reverter], há uma conscientização sobre os danos.  Os proprietários puderam ver que, ao longo dos anos, secaram grotas de água, determinados córregos.  Viram que a ocupação teve um impacto muito grande.”

O instituto trabalha, desde 2004, com a campanha ‘Y Icatu Xingu, que visa à recuperação das nascentes da região – muitos dos rios que formam o Xingu nascem fora do território indígena.  Entre as estratégias da iniciativa, que tem como meta revitalizar 300 mil hectares degradados do mata ciliar (que margeia cursos d’água), estão a formação de uma rede de sementes de espécies nativas, a capacitação de líderes e a promoção do desenvolvimento sustentável por intermédio da mídia local e de escolas.

As práticas a disseminar incluem o uso de curvas de nível, entre outras formas de controle da erosão, e a observância de critérios para a abertura de estradas.  Além disso, há cerca de 20 projetos pilotos buscando estabelecer formas de recuperação de vegetação adequadas para pequenas e grandes propriedades e assentamentos de reforma agrária.

“No caso da agricultura familiar, eles podem continuar usando a mata para culturas de subsistência, num método de agroflorestação, e no final do processo já se tem uma mata em recuperação”, diz Villas-Bôas.  “Quando se trata da pecuária, você precisa isolar a área, evitar que o gado pisoteie as nascentes.  Geralmente os grandes proprietários são resistentes ao trabalho de recuperação, e por isso estamos desenvolvendo metodologias para diminuir os custos e aumentar a eficácia.”  Ele cita o experimento com o uso de plantadeiras agrícolas no plantio de sementes de árvores amazônicas.

Segundo o coordenador, o ISA trabalha com vários parceiros no estado, entre eles ministérios e órgãos do governo federal, prefeituras, instituições de pesquisa e organizações da sociedade civil.  “Deveria haver linhas de crédito nos bancos, um pouco mais subsidiado, para esse tipo de investimento”, opina.

André Villas-Bôas compara o Xingu a um ralo dos processos que acontecem na região.  Sobre poluição na água que chega aos índios, diz não conhecer dados conclusivos, mas conta que está em curso um estudo com o Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam) e o povo Kinsedje (ou Suyá) sobre o Rio Pacas, que corta áreas de soja e de pecuária a leste e entra no parque.  “A entrada da ANA [Agência Nacional de Águas] nesse monitoramento vai permitir ampliar isso e ter uma visão integrada sobre a saúde dos afluentes do Xingu”, comenta.

Quanto às hidrelétricas previstas para a região, o antropólogo opina que existe uma série de dúvidas a esclarecer, em relação principalmente aos impactos na população de peixes – uma das principais fontes de alimento para os povos xinguanos.  O Complexo de Usinas Paranatinga, para abastecimento estadual, está em construção no Rio Kuluene, e a Usina Hidrelétrica de Belo Monte, no Rio Xingu, é um dos principais empreendimentos de energia destacados no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), do governo federal.

“Inicialmente, o principal impacto da Paranatinga é a forma de implantação, um processo absolutamente irresponsável e desastrado”, critica o representante do ISA.  “Não foi feito um trabalho de consulta regional.  Houve um processo de cooptação de lideranças indígenas com um impacto imenso.  Os Villas-Bôas demoraram 30 anos para um trabalho de pacificação, para que etnias, algumas até inimigas, convivessem [refere-se aos irmãos Cláudio, Orlando e Leonardo, que estiveram à frente da criação do parque].  E agora o Estado, que era importante nessa mediação, começa a promover a divergência entre esses povos para legitimar uma obra.”

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