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Pesquisadoras apontam inviabilidade da Usina Castanheira em estudo apresentado à Sema

Reunião foi realizada nesta quinta, 26, e reuniu indígenas, movimentos sociais, organizações e servidores do órgão.

Bruna Pinheiro/Formad

Um dos últimos rios livres da Bacia do Juruena, o Arinos morrerá aos poucos, caso seja aprovada a construção da Usina Hidrelétrica Castanheira, em Juara, no norte de Mato Grosso. A conclusão é de um estudo técnico apresentado nesta quinta-feira (25) à Secretaria de Estado de Meio Ambiente (Sema-MT), que contou com a presença de indígenas, movimentos sociais, organizações não-governamentais, servidores públicos e sociedade civil organizada. Além da necessidade de atualizar documentos elaborados há 17 anos, o estudo também aponta os impactos do empreendimento em pelo menos cinco povos indígenas, populações rurais e urbanas da região de Juara, Novo Horizonte e Porto dos Gaúchos.

A reunião foi solicitada à Sema pelo Fórum Popular Socioambiental de Mato Grosso (Formad), para apresentação do estudo técnico encomendado pela Operação Amazônia Nativa (Opan) sobre as consequências da construção da UHE Castanheira, em Juara. De acordo com o secretário executivo do Formad, Herman Oliveira, o objetivo é não só exercer o direito das populações em participarem do processo, como também demonstrar a inviabilidade ambiental, financeira e técnica da obra.

“Todos aqui sabemos que essa usina causará muito mais danos do que benefícios. Inclusive, ela já está causando prejuízos às comunidades mesmo antes de ser implantada. É fundamental que o processo de elaboração dos estudos ambientais feitos na época da apresentação do projeto seja revisto, pois há falhas. A sociedade não foi ouvida, os impactos socioambientais não estão sendo considerados, além dos protocolos de consulta aos povos indígenas, que nunca foram devidamente executados”, disse.

O laudo técnico, assinado pelas pesquisadoras Simone Athayde e Renata Utsunomiya, traz como conclusão que a construção da UHE Castanheira é inviável do ponto de vista ambiental, social, hidrológico e cultural. Elas ainda citam que a viabilidade econômica do projeto é questionável e que será o início da morte do rio Arinos com a implantação da usina, uma vez que a conectividade da bacia hidrográfica estará diretamente comprometida. Como resultados disso, no futuro, estão a redução no fluxo migratório de espécies de peixes e os impactos sobre todo o ecossistema.

“O Arinos é um dos últimos rios de fluxo livre da Bacia do Juruena. Ele é um rio especial porque abriga uma série de ecossistemas únicos, pequenas quedas d’água, cascatas e ambientes propícios para a reprodução de peixes. Sem falar nas espécies endêmicas, ou seja, que só são encontradas naquela região. Se todas as hidrelétricas planejadas para a Bacia do Juruena forem concretizadas, incluindo Castanheira, a morte do Arinos está próxima”, alertou Simone Athayde.

Outro ponto defendido pelas pesquisadoras é o Estudo de Componente Indígena (ECI) da UHE Castanheira, que só foi entregue em 2017, quase 10 anos depois do início das tratativas do empreendimento. “Há várias falhas de interpretação no projeto e discrepância dos conceitos utilizados. Notamos também que algumas recomendações técnicas não foram consideradas, além do Estudo de Componente Indígena, que traz uma série de questões para serem avaliadas, que não foi integrado ao EIA-Rima do projeto.”

Presente na reunião, o Defensor Público Federal Renan Sotto Mayor manifestou a sua preocupação quanto à Usina e aos impactos sobre as populações indígenas. Ele ainda reforçou a importância da consulta pública aos povos. “A Sema não pode confundir reunião com consulta prévia. Todo procedimento de consulta vale mais do que qualquer outro documento e o Estado é quem deve executá-lo. A Defensoria Pública da União já está de olho neste caso e estará na luta com os povos”, concluiu.

Viabilidade é questionada

Segundo a pesquisadora Renata Utsunomiya, o cenário para 2026 na projeção da construção da Usina Castanheira, com a expansão e o ritmo da agricultura mecanizada na região, os indicadores de fósforo, que revelam o uso de fertilizantes, já teriam extrapolado os limites estabelecidos pela legislação brasileira. Porém, em 2014, quando o EIA-Rima do empreendimento foi feito, estes indicadores já estavam acima do previsto em 2026.  

Representante do Movimento de Atingidos por Barragens (MAB), Jefferson Nascimento, questionou a viabilidade da obra diante de tantos impactos. “Só as 52 famílias da Comunidade Pedreira e Palmital geram R$ 6 milhões em produção por ano para Juara, enquanto a compensação da usina seria de R$ 3 milhões por ano. Como um projeto desses é viável economicamente? Qual a viabilidade técnica de uma usina que deve afetar diretamente cinco povos indígenas, além de agricultores familiares e sociedades urbanas? Temos que voltar atrás com esse projeto e que haja uma discussão mais ampla”, defendeu Jefferson.

As pesquisadoras elencaram como recomendações a possibilidade de uma reavaliação estratégica do projeto. “Não estamos mais em 2006, já é 2023 e temos muitas questões para serem consideradas É preciso refazer essa proposta ou atualizá-la. Por que insistir em um projeto que já se mostrou inviável?”, questionou Simone.

Povos indígenas defendem o rio

Em abril deste ano, lideranças do povo Rikbaktsa, das Terras Indígenas Japuíra, Escondido e Erikpatsa, localizadas na região Noroeste de Mato Grosso, solicitaram o arquivamento do processo de licenciamento da UHE Castanheira. Durante o Acampamento Terra Livre Mato Grosso (ATL), realizado em Cuiabá, uma carta assinada pelos indígenas foi entregue à Sema, trazendo os maiores impactos e irregularidades do projeto.

“O rio Arinos faz parte da nossa vida. O rio é fonte de vida, de alimento, coletamos ervas medicinais na beira do rio, tracajás, ovos de tracajás, sementes, castanhas e também dois caramujos que fazem parte do nosso ritual de casamento, o tutãra e waibubutsa. Sem o rio perderemos nossa cultura tradicional do casamento”, cita um trecho do documento.

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