Com foco na COP-30, oficina com povos e comunidades tradicionais para discutir agenda climática é realizada em MT

A atividade reuniu representantes de mais de 10 organizações do estado.

Por Bruna Pinheiro / Formad

Com a realização da Conferência da ONU sobre Mudanças Climáticas (COP-30), em Belém (PA), o ano de 2025 pode ser decisivo para a representação de povos e comunidades tradicionais de todo o país na agenda climática internacional. Pensando nisso, foi realizada a Oficina PCTs e Clima, que teve como objetivo discutir a construção de políticas climáticas e espaços de participação de povos e comunidades, trazendo representantes de Mato Grosso. A atividade, promovida nos dias 16 e 17 de outubro pelo Formad, ICV e OPAN reuniu mais de 10 organizações do estado, em Cuiabá (MT).

Dando início às discussões, a programação contou com um espaço para o compartilhamento de “aflições climáticas”, em que cada participante ao se apresentar pôde dividir a realidade de seus territórios em um momento de troca de experiências. A rodada também oportunizou o “pensar juntos” sobre o que cada povo e comunidade espera de mudanças para o futuro.

O nosso povo deixou muita coisa, mas o que não está dentro de reserva, vem desaparecendo com os impactos de invasores de pecuária e o grande incêndio que está acabando com tudo isso. A minha sugestão de solução é de começarmos por aqui, nos unindo, como estamos aqui”, relatou o pescador Lourenço Pereira Leite da Associação Xaraiés.

Além de questões ambientais, também foram mencionadas como aflições as ameaças aos territórios e a ausência de PCTs no processo de participação social em agendas climáticas e outros temas. “A minha principal preocupação é o desconhecimento de processos políticos, leis e decretos colocados debaixo dos panos e que só descobrimos quando afetam as comunidades. O respeito social é uma necessidade! Vivemos um processo de extermínio da nossa própria existência”, disse a representante dos povos de terreiro Mãe Joyce Lombardi, fundadora e vice-presidente do Instituto Sementes do Bem. 

Uma das realizadoras da oficina, o próprio Formad constituiu-se como resultado de um processo de mobilização social em Mato Grosso semelhante à época da Eco-92, realizada no Rio de Janeiro. “Este espaço de construção é de extrema importância. Em 92 foi um marco na construção da luta indígena e os PCTS estavam mais invisíveis. A nossa busca por formar um coletivo é legítima e a COP-30 pode ser um marco na luta por visibilidade, assim como foi a Eco-92”, frisou o secretário executivo do Formad, Herman Oliveira.

Participaram da oficina representantes da AMORARR, Associação da Comunidade Taboca, Associação Xaraiés, Conaq-MT, Fepoimt, Instituto Sementes do Bem, Levante da Juventude Popular, Rede de Comunidades Tradicionais Pantaneiras, Unicafes e lideranças da Reserva Extrativista Guariba Roosevelt.  A atividade contou com a facilitação de Patrícia Zuppi, indigenista, gestora de projetos socioambientais e interculturais e assessora internacional do Conselho Indígena de Roraima (CIR) para o mandato de co-chair de Sineia do Vale para a COP-30.

Para a coordenadora do Programa de Direitos Socioambientais do ICV, Deroni Mendes, a participação diversa do evento demonstra as diferentes possibilidades de atuação e discussão destas organizações em espaços como a COP.

Precisamos nos unir para falar a mesma pauta, mas com recortes diversos, e criarmos estratégias para que não continuem a discussão sobre nós sem nós.  A pauta climática precisa ir para além dos povos indígenas, de quem tomamos como exemplo de luta. Então é o momento de se unir e potencializar as agendas”, destacou.

Movimento indígena como referência em participação social

Compartilhando a experiência da luta do movimento indígena na agenda climática, a coordenadora de gestão territorial e ambiental do Conselho Indígena de Roraima (CIR), Sinéia do Vale participou virtualmente da oficina. Atualmente, uma forte representante indígena em fóruns internacionais, Sineia destacou a importância da abertura de diálogos para ampliar a incidência nessas agendas, além das vivências nos territórios para compartilhar conhecimentos e somar forças entre os parentes.

“Muitos dos nossos não sabem o que é mudança climática. Tem que ter um linguajar próprio para tratar nas comunidades entenderem o que estamos discutindo a sua importância. Quem sente primeiro os impactos dessas mudanças são os povos indígenas, as comunidades tradicionais, os ribeirinhos e todos aqueles conectados diretamente com as florestas. Por isso, temos que ter nosso lugar de fala em câmaras técnicas, e outros espaços paritários”, disse.

Apesar das dificuldades e até uma certa paralisação das discussões nos espaços de participação em alguns períodos, o movimento indígena é uma inspiração para a luta de outros povos pela força e resistência ao longo dos últimos anos. “Mesmo com tudo isso, o movimento continuou viajando e buscando dialogar para se manter vivo dentro desses espaços. Conseguimos manter pessoas para discutir cada temos com negociadores, o que facilita a compreensão e abre espaço para diálogo com outros atores do governo. Assim, a garantia e gestão dos territórios têm conexão com a discussão climática”, acrescentou Sineia do Vale.

COP-30 no Brasil

Pela primeira vez, a COP será realizada no Brasil, mais precisamente em território amazônico. A capital do Pará foi a escolhida para sediar a edição de 30 anos da Conferência, que reúne representantes de quase 200 países para o objetivo comum de diminuição das emissões de gases do efeito estufa, contenção ao aquecimento global e atualização de compromissos firmados pelos países signatários da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima, a UNFCCC. Nos últimos anos, o evento tem sido provocado a incluir a participação de PCTs nas discussões. Mas antes dela, haverá a COP29, que acontecerá em Baku, no Azerbaijão, entre os dias 11 e 22 de novembro.

A coordenadora do Programa de Direitos Indígenas da OPAN, Andreia Fanzeres, explicou que a Oficina PCTS e Clima surgiu justamente da ideia de preparar e formar representantes de Mato Grosso com o foco em uma melhor incidência na COP-30. “É uma realização ver que fomos capazes de reunir tanta gente disposta a somar nessa luta da participação de PCTs na agenda do clima. Pudemos ouvir quem já está na luta, trocar conhecimentos e construir novas possibilidades. É um primeiro passo, uma primeira conversa de muitas que ainda faremos. A COP-30 é uma oportunidade importante para essa discussão e temos que aproveitar isso”, reforçou.

A expectativa do governo federal é de que a “COP do Brasil”, em Belém (PA), registre um fluxo de mais de 40 mil visitantes. Deste total, cerca de 7 mil pessoas compõem a “família COP”, como é chamada as equipes da ONU e delegações de países membros. “Uma coisa é discutir a Amazônia no Egito; outra coisa é discutir a Amazônia em Berlim; outra coisa é discutir a Amazônia em Paris. Agora, não. Agora nós vamos discutir a importância da Amazônia dentro da Amazônia. Nós vamos discutir a questão indígena, vendo os indígenas. Nós vamos discutir a questão dos povos ribeirinhos, vendo os povos ribeirinhos e vendo como eles vivem“, já anunciou o presidente Luís Inácio Lula da Silva. 

A Oficina PCTs e Clima contou com o apoio do Instituto Clima e Sociedade (iCS), da Fundação Mott e do Fundo Kawari.

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